Sexta 19 de Abril de 2024

Nacional

Crise no governo Lula ?

05 Dec 2004 | Se a análise imediatamente posterior à conclusão das eleições de outubro expressava um resultado contraditório e em grande medida ainda indefinido para o governo e para o PT, há quase um mês das eleições os acontecimento que passaram a tomar conta do Planalto expressam uma dinâmica inquestionavelmente desfavorável para Lula.   |   comentários

Apesar do PT ter-se tornado o partido mais votado do país, conquistado mais do que o dobro do número de prefeituras que tinha até então, aumentado o número de capitais em que governa e obtendo o maior percentual de prefeitos reeleitos, essas conquistas foram completamente obscurecidas pelas derrotas que o partido do governo sofreu nos principais centros urbanos do país. Esse resultado mostra que, pelo menos em relação a importantes setores organizados da classe trabalhadora e da classe média, o ciclo de recuperação do crescimento não tem sido suficiente para impedir que os brutais ataques às condições de vida das massas, a oposição de setores da burguesia à política económica em curso, os escândalos de corrupção que atingem o Planalto e as medidas direitistas como a recente defesa dos torturadores e assassinos da ditadura militar, desgastem as ilusões depositadas no governo Lula.

Até mesmo expoentes do próprio governo e do PT reconhecem o golpe sofrido. José Genoíno afirmou que “algumas derrotas são muito pesadas para nós” , enquanto para Tarso Genro “a perda de Porto Alegre, para uma frente liderada pelo PPS, e a perda de São Paulo, para uma frente liderada pelo PSDB, são duros golpes na nossa auto-estima” .

A relação do governo com a base aliada e a governabilidade pós-eleições

Após as eleições, como subproduto das derrotas sofridas pelo PT, os conflitos interburgueses têm ganhado uma nova força, expressando-se de forma mais evidente na crise que atinge a base aliada logo após a conclusão do pleito.

A expressão mais contundente das novas crises na relação do Planalto com a base de partidos aliados são as recentes pressões de importantes setores dentro do PMDB para que o partido renuncie aos seus cargos no governo e se some às fileiras oposicionistas. A Convenção Nacional do PMDB que ocorreria em 2005 foi antecipada para o dia 12 de dezembro, quando o partido deverá tomar uma posição definitiva. A declaração de Aldo Rabelo, ministro da Coordenação Política, segundo o qual a aliança com o PMDB é "fundamental para a governabilidade do país" , expressa os graves riscos que envolvem uma possível ruptura. Além do PMDB, o PPS, após sentir-se fortalecido com a vitória sobre o PT em Porto alegre, passa a ameaçar publicamente abandonar seus cargos e deixar o governo; e o PP, o PL e o PTB também buscam negociar mais poder para continuar mantendo seu apoio.

Em meio às disputas que envolvem tanto a reorganização de forças para as eleições de 2006 como a eleição para as duas casas do Congresso no início de 2005, a agenda do Congresso encontra-se praticamente paralisada: "Há uma crise entre Executivo e Legislativo e o governo tem que assumir isso. Há uma falta de respeito com o Congresso, e não estou me referindo a oposições. O governo não respeita sua própria base" .

Crescem conflitos dentro do governo e do PT

A reunião do Diretório Nacional do PT que ocorreu nos dias 20 e 21 de novembro esteve marcada pela polarização entre as correntes da esquerda e as correntes da ala majoritária do partido. Um grupo de 15 parlamentares apresentou à reunião um documento alternativo ao da cúpula partidária, contendo diversas críticas ao governo, dentre as quais se destacaram as que dizem respeito à política económica e à relação do governo com o Exército.

A novidade das atuais críticas é que se desenvolvem em meio a perspectivas de crescimento de 4,5% do PIB para este ano e que desta vez as críticas não vieram apenas por parte das correntes da ala esquerda do partido, mas também de importantes expoentes do campo majoritário, como Marta Suplicy, que em documento distribuído para a imprensa atribui sua derrota eleitoral em parte à política económica implementada pelo governo Lula devido à “deterioração do poder aquisitivo dos setores populares, incluídos os setores médios” .
Esses desgastes é que estão por trás da recente onda de baixas que atingiu o governo. Primeiro cai o presidente do BNDES, Carlos Lessa, que chegou a chamar de “pesadelo” a gestão de Meirelles à frente do Banco Central. Em seguida, pede demissão o presidente do Banco do Brasil, Cássio Casseb, que perdeu no confronto com setores ligados ao próprio PT que questionavam sua gestão. Além disso, vários aliados tradicionais e amigos pessoais de Lula começaram a sair do governo, como Frei Betto, Bernardo Kucinski, Ricardo Kotscho e Ana Fonseca.
Essa onda de desgastes do Planalto tem alimentado críticas da CUT, do MST e importantes intelectuais ligados ao PT, como Chico Buarque e Oscar Niemayer, sendo que faz parte desse processo a manifestação contra a política económica do governo organizada pelo MST, pela CUT e pela UNE para o dia 25 de novembro em Brasília, à qual a imprensa tem anunciado que contará com alguns ministros.

Crise no governo?

Ao tentar controlar a crise junto aos demais partidos da base aliada, o governo pode abrir ainda mais crise junto ao PT, pois o próprio Lula já disse que a reforma ministerial em curso vai implicar em “cortar na carne” , o que não significa mais que tirar espaço de seu próprio partido para incorporar os demais.

Para definir a dinâmica do governo nos próximos meses, cumprirá um papel fundamental sua capacidade para disciplinar sua base aliada, principalmente o PMDB, e a capacidade da burocracia cutista de continuar amortecendo a luta de classes. Além disso, também será fundamental o desdobramento dos confrontos que se darão na implementação das reformas universitária, trabalhista e sindical ’ que tornarão mais evidentes a relação do governo com o movimento de massas e sua vanguarda.

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