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Cultura

NOVO CD

“Cores e valores”: Racionais MC’s voltam à cena

29 Nov 2014   |   comentários

Depois de doze anos de espera, os Racionais MC’s lançaram no final de novembro o novo CD, intitulado “cores e valores”. Mais do que um álbum, o significado do lançamento do mais importante grupo de rap ainda está por se construir nos shows e na influência que ele gerará.

Depois de doze anos de espera, os Racionais MC’s lançaram no final de novembro o novo CD, intitulado “Cores e Valores”. Mais do que um álbum, o significado do lançamento do mais importante grupo de rap ainda está por se construir nos shows e na influência que ele gerará. Mas ao contrário das primeiras críticas (na Folha de São Paulo ou na Rolling Stones) que querem um Racionais “que abandonou o discurso crítico”, achamos que o novo CD propõe uma nova forma para afirmar o que existe de melhor no conteúdo já histórico no grupo: o retrato abrangente da luta dos negros contra o racismo, em seus dilemas e anseios.

O álbum novo traz quinze faixas em que os vinte e cinco anos do grupo são retomados, conjuntamente aos temas mais debatidos no grupo. A faixa “Quanto vale o show?”, single lançado antes do CD, traz na voz de Mano Brown a lembrança dos inícios da trajetória do cantor, no Capão, em 1983. Edi Rock também canta os vinte e cinco anos do grupo a partir de sua biografia, na música “o Mal e o Bem”. De certa forma, é um espécie de balanço do grupo, em que as músicas se encontram articuladas de tal forma que, ao ouvir o CD completo encadeado, parece-se ouvir apenas um som continuo.

O eixo articulador do grupo também nesse CD é a questão negra no Brasil: a denúncia do racismo começou estridente desde o primeiro disco, onde se questionava os “racistas ou otários”, avançou no disco "Sobrevivendo no Inferno" para a denúncia do brutal massacre no Carandiru, com “Diário de um Detento” e ganhou uma profundidade impressionante em 2002 com “Negro Drama”, que virou um hino “sociológico” da questão negra no país. Agora Racionais volta com “Cores e Valores”.

Desde esse ponto de vista todos os discos de Racionais abordam temas chaves ligados a questão negra no Brasil: em primeiro lugar a questão da violência policial, que no novo CD ganha contornos na descrição do show de 2007, que teve grande repressão e tornou a praça da Sé um “cenário de guerra”, na música “A Praça”.

Depois, fruto da desigualdade, “a máquina, a fábrica de criminalidade” (O Mal e o Bem), o tema da “ida ao crime”, sempre acompanhada de desilusão, morte, perda de amigos, fracasso, o tema da vida no crime sempre aparece em Racionais. O clássico “Mano na Porta do Bar” na década de ’90 deu lugar depois a “To Ouvindo Alguém Me Chamar” e, em 2002, “Eu sou 157”. Em todos se retratava a ascensão e derrocada no crime organizado. No novo CD, repete-se a temática, na faixa “A Escolha Que Eu Fiz".

Por fim, aos dilemas dos negros no Brasil, além das dificuldades e a pobreza, também tem implicância às questões subjetivas, a herança racista, o apartheid (à brasileira) que mesmo a mudança das condições de vida não consegue mudar. “Você tá dirigindo um carro, o mundo inteiro tá de olho em você, sabe por que? Pela sua origem” ....”o negro drama”, questionava Brown no último disco.

Na faixa “Eu compro”, retoma-se essa temática,

"Eu quero, eu compro e sem desconto! "
À vista, mesmo podendo pagar
Tenha certeza que vão desconfiar
Pois o racismo é disfarçado há muito séculos
Não aceita o seu status e sua cor”

Ou seja, no fundamental, o novo disco dos Racionais continua “clássico”. Com letras muito menores, músicas de 3 a 5 minutos, ele fica mais acessível. Na toada de KL Jay, a influência de Tim Maia, Jorge Ben etc. é o que mais se ressalta num rap que “nasceu nacional”, a despeito das influências norte-americanas que possam se notar no novo disco. A preocupação em se manter mais que uma “música de protesto”, um “canto de guerra” dos negros do Brasil deve ser latente em todos os fans no país.

Sob as cores “laranja e preto”, em uma homenagem ao “neguin” (amigo do grupo morto em um acidente), o novo disco encontra um encarte com os quatro membros vestidos de garis. Depois da música Mariguella, onde se retomou a palavra “revolução”, soa no mínimo curioso que o encarte do grupo nesse disco sejam eles vestidos de garis (a categoria que fez a greve mais espetacular nesse ano, com grande vitória).

Cores e valores volta à cena....“Tá lançada a sorte...”

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