Sexta 19 de Abril de 2024

Internacional

Continuam as manifestações nos EUA: nossa cobertura dos atos de Providence e Filadélfia

09 Dec 2014   |   comentários

A insatisfação vai tomando as ruas e com sua força vai se expressando através dos mais diferentes atores

Providence, 5/12

Na sexta-feira 5 de Dezembro, dois dias após o veredito que não aceitou o indiciamento no caso de Eric Garner, cerca de 400 manifestantes tomaram as ruas de Providence, no pequeno estado na costa leste de Rhode Island. A maior parte dos manifestantes eram jovens – estudantes e jovens moradores da cidade. Protestavam contra a violência policial. O evento no facebook que convocava a manifestação dizia que precisamos é “indiciar os EUA” – que o racismo norte-americano seria responsável pelas mortes de Eric Garner, Tamir Rice, Aiyanna James e outros.

Cerca das 18hs os manifestante tinham se reunido em uma escola do ensino médio em meio a um intenso frio. Notava-se como não era uma manifestação “normal”: depois que os manifestantes tinham bloqueado o trânsito de uma rodovia por 20 minutos semana passada e 8 pessoas tinham sido presas, desta vez a polícia estava preparada. Dezenas de policiais cercavam a manifestação em cada um de seus lados. Não havia caixas de som, estava difícil de ouvir o dirigente da NAACP [Associação Nacional para o Avanço das Pessoas de Cor – tradicional movimento negro que tornou-se uma famosa ONG – nota do tradutor] ler os nomes das pessoas que foram mortas pelos policias.

Quando a manifestação começava, caminhamos pela rua e muitas pessoas buzinavam em apoio conforme passávamos por bairros de população da classe trabalhadora. Logo após isto algumas pessoas começaram a subir na cerca para tentar ocupar a rodovia como tinham feito na semana anterior. E imediatamente uma coluna de policiais aparecia para lhes bloquear. Quando o protesto chegou em um cruzamento importante os manifestantes deitaram na rua em um “Die in” – a ação que se popularizou ultimamente, ela consiste em deitar no chão e bloquear o trânsito, simulando os corpos mortos de tantos negros. Os manifestantes durante toda a manifestação cantavam “não posso respirar”, “se não tivermos justiça, vocês não terão paz” e “de quem é a rua? É nossa rua”.

Depois disto a manifestação bloqueou um outro cruzamento muito importarte, e desta vez o “Die in” durou quatro minutos e meios, e durante este tempo os participantes batiam em seus peitos imitando um batimento cardíaco – simbolizando as quatro horas e meia que Mike Brown ficou no chão esperando uma ambulância para recolher seu corpo. Depois disto cantávamos “não posso respirar” onze vezes – o número de vezes que Eric Garner falou estas palavras antes de morrer.

Por fim o protesto tomou as escadarias do único shopping em Providence (um local que também é muito utilizado nas sextas-feiras à noite). O ato não pode entrar no Shopping porque, novamente, uma coluna de policiais o impedia. A chuva castigou o final do ato e muitos se dispersaram mas não sem antes retornar a escola onde havia começado todo o percurso.

A repercussão do ato, vendo as pessoas nas ruas e nos carros, e que não houve nenhuma agressividade, nenhuma menção negativa mostra o apoio que as manifestações vem ganhando. Mesmo com as prisões da semana passada não conseguiram limitar as ações desta semana, e mesmo com a chuva e com o frio, uma manifestação tirou a calma desta pacata cidade em uma sexta à noite.

Publicamos abaixo algumas fotos desta manifestação:

Filadelfia, 7/12

No domingo um grupo religioso chamado “Power” (da sigla em inglês que significa moradores de Filadélfia organizador para testumanhar, “empoderar” e reconstruir) organizou um “die in” nesta cidade. Grupos religiosos participaram desta manifestação ecumênica que pretendia abordar problemas que afeta todos moradores de Filadélfia, tais como: violência policial, educação, direitos dos imigrantes, etc.

Cerca de 200 manifestantes se reuniram próximos a um estádio de futebol americano à noite, em horário de jogo. Pastores, rabinos e outros líderes religiosos fizeram sermões sobre a violência policial. Em seus sermões os líderes religiosos pediam para que rezassem e colocam sua fé em Deus, enquanto ao mesmo chamavam a se organizar para resistir a violência policial. Mesmo estes líderes religiosos faziam numerosas referências a questões da classe trabalhadora, e argumentavam como há dinheiro para estádio mas que não havia dinheiro para pagar aos trabalhadores que vendem pipoca mais que um salário mínimo. Houve um pastor que dizia que deveríamos nos importar com as vidas dos negros também quando recebiam um salário mínimo em um Walmart.

Os pastores decidiram que seria bloqueada uma rodovia por quatro minutos e meio, simbolizando as quatro horas e meia da espera da ambulância de Mike Brown, realizando o “die in” que é como esta manifestação foi convocada. Os pastores discursavam que era necessário interromper a calmaria cotidiana dos EUA, fosse interrompendo as compras do Black Friday (que segundo os jornais tiveram uma queda de 11% nas vendas este ano) ou o trânsito.

Depois de meia hora de mais sermões os manifestantes bloquearam a rodovia que estava cheia de policiais – fileiras e fileiras em bicicletas, motos, e carros. Quando o jogo de futebol americano terminou alguns torcedores insultaram os manifestantes. Sinal da polarização que vai se expressando nas ruas.

Depois disto o protesto se dividiu em dois grupos, um que foi novamente rezar com os pastores e outro que se enfrentava com os torcedores de futebol americano gritando “Black Lives Matter” (“as vidas dos negros importam”). A oposição destes torcedores do Filadélfia Eagles demonstram que as manifestações estão tirando as pessoas da rotina, e já não são algo que podem ser ignoradas, tirando aquelas que se opõe e querem perpetuar uma justiça racista também a tomar posições.

Porém, justamente devido a esta polarização, e justamente ao ver o papel dos líderes religiosos e como até eles devem chamar muitas manifestações (várias por semana em algumas cidades), falar de salário, da luta da classe trabalhadora, da violência policial, o que se vê não é o velho Estados Unidos da calmaria, mas um Estados Unidos que por diferentes poros da sociedade, através dos mais diferentes atores, vai brotando o novo. O grito que a repressão às greves, e a violência policial aos negros não consegue calar.

Fotos da manifestação em Filadélfia:

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