Sexta 29 de Março de 2024

Educação

Como conciliar escola em tempo integral com uma jornada de trabalho em tempo integral?

23 Feb 2015   |   comentários

Conciliar educação e trabalho faz parte da vivência de milhões de jovens trabalhadores-estudantes.Levar em conta essa realidade é fundamental para pensarmos as políticas educacionais como parte das políticas para o conjunto da classe trabalhadora.

A ampliação da jornada escolar tem sido uma das fórmulas mais recorrentes das propostas de reforma do Ensino Médio. A implementação das escolas de tempo integral é quase um consenso entre os formuladores das políticas educacionais. Nessa questão há pouco resquício da falsa polarização que o PT e o PSDB tentaram desenhar na última campanha eleitoral. A ampliação do ensino em tempo integral é meta tanto do governo federal quanto de diversos governos estaduais como Ceará, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Piauí.

O aumento no número de matrículas em tempo integral é uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024, homologado pela presidenta Dilma no ano passado. A meta é oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender 25% dos alunos da educação básica.

O número dessas escolas já vinha crescendo rapidamente nos últimos anos. Só em 2014 o número de matrículas em tempo integral aumentou 41%, passando a atingir 4,4 milhões de jovens estudantes.

Entre as poucas certezas do projeto de reforma do Ensino Médio do governo federal, que o ministro Cid Gomes está para apresentar, está o incremento no número de escolas em período integral.

Em São Paulo, as escolas de tempo integral do governo Alckmin (PSDB) atingem 130 mil estudantes, segundo informações do próprio governo. A jornada escolar nessas escolas paulistas é de nove horas e meia.

Pode parecer óbvio que o aumento do tempo do aluno na escola vá na direção da valorização da educação. Entretanto esse modelo pode se tornar fator de marginalização e secundarização de uma importante parcela da juventude brasileira.

Não é a toa que em São Paulo há imensa resistência das comunidades escolares aceitarem a implementação do projeto de ensino em tempo integral. Mais da metade das escolas consultadas têm se negado a participar do projeto.

O projeto não leva em conta a diferença de oportunidade na disposição do tempo por parte da juventude brasileira. Tomar o jovem indistintamente como um ser ocioso é um erro que só comete quem parte apenas de um conceito abstrato de juventude, não percebendo as sisões de classe que a atravessa. Grande parte da juventude brasileira é trabalhadora.

Conciliar educação e trabalho faz parte da vivência de milhões de jovens trabalhadores-estudantes. Seja no trabalho reprodutivo doméstico (cuidando da casa ou das crianças menores), seja no trabalho remunerado (notadamente informal e precário), grande parte da juventude brasileira que frequenta a escola é trabalhadora.

Levar em conta essa realidade é fundamental para pensarmos as políticas educacionais como parte das políticas para o conjunto da classe trabalhadora. O apontamento que a Presidenta Dilma fez de mudança nas regras no auxílio desemprego (que atingiria notadamente essa juventude já excluída do seu projeto de escolas de tempo integral) vai no sentido inverso do lema “Brasil, pátria educadora”, pois que precariza ainda mais a condição de vida e dificulta o acesso e permanência nos estudos dessa parcela da população.

O que se tem que fazer é bem o inverso, disponibilizando tempo e recurso para que a juventude trabalhadora possa cada vez mais frequentar a escola.

Assim, mais que aumentar o tempo de permanência do aluno na escola, uma das políticas educacionais mais importantes seria a redução da jornada de trabalho sem redução salarial, para que assim se possa articular a educação com o trabalho como duas dimensões reais e fundamentais da experiência da classe trabalhadora. Sem a redução da jornada de trabalho, implementar uma educação em tempo integral que exclua parte significativa dos jovens brasileiros é uma medida reacionária. Não se pode pensar uma política educacional sem levar em conta a vivência concreta da população para a qual ela se dirige. Pois de outra forma continuará a pergunta: como articular uma escola em tempo integral com uma jornada de trabalho de tempo integral?

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