Quinta 18 de Abril de 2024

Internacional

Venezuela

Chaves cede à oposição

05 Jul 2004   |   comentários

Em Caracas, em 3 de junho, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE), apesar das denúncias de fraude, anunciou a validade de mais de dois milhões de assinaturas coletadas pela oposição da Coordinadora Democrática que tenta convocar um referendo revogatório para destituir o presidente Chaves, que originalmente deveria concluir seu mandato em 2006. Começa assim um novo ato do drama venezuelano caracterizado por uma dinâmica de revolução e contra-revolução nos últimos anos. A oposição possui mais uma vez a oportunidade de tirar Chaves, mas agora de maneira “constitucional” e “democrática” via o referendo, procedimento contemplado na Constituição Bolivariana. Por isso, para Chaves é uma “vitória sobre a oposição, porque foi retirada do caminho do golpismo e do terrorismo, e colocou-se no caminho da constituição bolivariana” .

A decisão do CNE legalizou as pretensões da truculenta oposição, apoiada pelos Estados Unidos, que fragilizou os mais elementares princípios democráticos desde que levou a cabo um fracassado golpe de estado até a sabotagem do coração da economia do país: a indústria petroleira e a desorganização da produção e distribuição de insumos básicos para os setores populares, um esforço imenso de inumeráveis atos de desordem pública e terrorismo.

O Secretário de Estado Colin Powell, e o novo Secretário Geral da OEA, Rodriguez, declararam em Quito sentirem-se felizes pela convocação do referendo. Não é para menos; nos últimos meses se acentuou a escalada agressiva do imperialismo norte-americano contra a Venezuela, expressa em declarações ’ a favor da oposição ’ e pressões de funcionários como Condoleeza Rice, Roger Noriega e até o candidato democrata à presidência, Kerry.

Na Venezuela, a missão conjunta da Fundação Carter e a OEA cumpriram um papel determinante ao facilitar, em maio de 2003, o acordo entre governo e a oposição como saída para a situação de enorme polarização social, intensificando a luta de classes e elementos de guerra civil que se desenvolveram no país entre os anos de 2002 e 2003.

O imperialismo e o setor mais concentrado da burguesia venezuelana começaram deste modo uma nova fase em seu objetivo de destituir Chaves e instaurar um regime abertamente pró-imperialista para recolonizar a Venezuela e transformá-la em um ponto de apoio para desferir uma política ofensiva e reacionária sobre o resto do continente.

Como se chegou ao referendo?
A responsabilidade de Chaves

A oposição golpista da Coordinadora Democrática estava desorganizada, dividida e desmoralizada, sem um líder. Hoje, porém, festeja e se encontra fortalecida, e cedo ou tarde voltará às provocações, como mostra a recente desarticulação e prisão, em Caracas, de grupos paramilitares colombianos pagos pela oposição para criar distúrbios no país.

Logo após o golpe de estado de abril de 2002, uma verdadeira irrupção das massas restituiu Chaves no poder. Havia casos de confraternização entre os soldados, que desobedeciam os golpistas, e os trabalhadores, ao tempo que se colocou em marcha um verdadeiro processo de reorganização popular com comitês pela terra, sindicatos classistas e assembléias populares. Contudo, a política de Chaves foi de chamar a pacificação e a reconciliação nacional em meio a um país fraturado social e politicamente. Por isso, o Tribunal Superior de Justiça deixou livres os oficiais golpistas. Até o final deste mesmo ano, a oposição voltou à ofensiva com o lockout petroleiro, apoiado pela burocracia sindical e seguido por uma parte importante das classes médias, que provocou perdas de milhões de dólares ao país.

Uma vez mais foram os trabalhadores e o povo quem deram tudo de si próprios desferindo uma grande iniciativa para derrotar a nova provocação. Os trabalhadores ocuparam as fábricas abandonadas por empresários, introduziram elementos de controle operário da produção em algumas empresas e sobretudo na estatal petroleira PDVSA, criaram sindicatos democráticos, resistiram a ofensiva dos empresários de descarregar os custos da crise sobre as suas costas. O lockout foi desgastado e o governo retomou a iniciativa política. A oposição voltou a encontrar-se em debandada. Derrotado o setor mais “duro” da oposição, os Estados Unidos tenderam a apoiar-se no setor “moderado” desta e, apelando agora para a pressão via OEA e Fundação Carter, buscar maiores espaços políticos para a “contra” ainda que nos marcos do regime chavista. Deste modo a estratégia de curto prazo da embaixada norte-americana e da oposição é anular Chaves e, mais adiante, disputar eleitoralmente o poder do chavismo, aproveitando o descontentamento que existe em amplos setores por anos de polarização política e crise económica.

Os limites do nacionalismo burguês

Como vemos, se a situação chegou a esse ponto é em grande parte responsabilidade de Chaves. Toda a timidez e vacilação para enfrentar a oposição reacionária se devem ao caráter burguês do regime chavista. Toda sua inconseqüência, terminou na mesa de negociação capitulando frente à oposição. Inclusive hoje, Chaves declarou que: “faço-lhes um chamado à reflexão, à unidade. Este projeto bolivariano não é inimigo de vocês. Nem dos que militam na oposição... são nossos irmãos, queremos viver em paz com eles, porque são venezuelanos/as; minha mensagem de paz, minha mensagem para que aproveitemos a conjuntura do referendo nacional para que cada um vá opinar em paz” (Venpres, 9/6/04). Assim, enquanto segue chamando a unidade, a oposição utiliza os meios de comunicação livremente como agitadores reacionários e preparam novas investidas e provocaões.

O governo Chaves, baseado nas castas militares e no aparato de estado, tentou “elevar-se” por cima das classes sociais em conflito após a demolição do velho regime de partidos que governou o país por quarenta anos até o final dos anos 90.

Chaves se apresentou como o grande “reconciliador” da nação apelando a um discurso antineoliberal para evitar que o movimento de massas seguisse um curso independente. Por sua vez, deu concessões e paliativos ao movimento de massas, para melhorar sua margem de manobra com o imperialismo.

No entanto, por seu caráter de classe, é incapaz de romper com o imperialismo e satisfazer plenamente as demandas elementares das massas do campo e da cidade. Assim, enquanto critica a guerra imperialista no Iraque, paga pontualmente a dívida externa e supre de petróleo os EUA, do qual é um dos principais fornecedores. Assim, em meio à brutal crise económica provocada pelo lockout patronal não tocou a base do poder da burguesia golpista; ou seja, a propriedade dos grandes bancos, meios de comunicação, para estabelecer uma genuína nacionalização de toda a indústria dos petrolífera para impedir a sabotagem económica.

Uma vez mais volta a confirmar que a luta pelas reivindicações nacionais em uma semicolónia não pode ficar nas mãos da burguesia nacional nem de seus representantes, como demonstraram as experiências históricas na Argentina, com Perón nos anos 50, e no Chile, com Allende em 73.

De nada servem a retórica anti-ianque de Chaves e suas ameaças de derrotar o fascismo e a oligarquia, tampouco suas respostas improvisadas de contragolpe, como seus atos massivos, se não existem consignas precisas e objetivos políticos concretos.

Os trabalhadores, que deram até sua vida para defender o que consideram suas conquistas, deram mostras de sobra de sacrifício e determinação para enfrentar a contrarevolução. Para isso, os trabalhadores e os setores populares precisam da mais ampla mobilização e organização independente para lutar pela expropriação dos conspiradores e dos golpistas e para expulsar do país o imperialismo.

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