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Capitalismo escravagista

19 Feb 2010   |   comentários

Segundo dados do Ministério Público do Trabalho só no ano de 2009 foram mais de 3.500 trabalhadores encontrados em situação análoga a de escravo no Brasil [1]. A comissão pastoral da terra estima que hajam ainda mais de 25 mil vítimas de trabalhos forçados em todo o país, número que pode ser bem maior se levarmos em consideração que só entre anos de 2004 e 2008 foram resgatados 21.667 trabalhadores .

Estudos e pesquisas mostram que as regiões onde o empresariado têm uma “face” mais moderna não estão isentas dessa prática criminosa. Entre janeiro e setembro do ano passado foram 743 autuações nos Estados do Sudeste, números que levaram a área mais rica do país ao topo do ranking das regiões com mais trabalho escravo [2].

O Estado de São Paulo, governado pelo tucano Serra, convive, no campo e nas cidades, com o trabalho escravo. Em 2006, o ministério público denunciou que mais de 80 fornecedores da C&A, uma das maiores lojas de varejo de roupas do mundo, utilizam mão de obra escrava, principalmente de imigrantes bolivianos.

Além dessas denúncias, recentemente a usina Jungueira, localizada no interior do estado paulista, que pertence ao grupo Cosan, que também controla a marca de distribuidores de combustíveis ESSO, o açucar União, entre outros, teve seu nome inserido na “lista suja” do ministério do Trabalho que mostra as empresas acusadas de uso de mão de obra escrava. Foram registrados 13 autos de infração na usina, entre eles, trabalhadores sem registro formal, menores de 18 anos em trabalho pesado, falta de vasilhas para refeições, instalações sanitárias insuficientes, ausência de local adequado para refeições, alojamento sem condições adequadas, chuveiros e roupas de cama insuficientes. Mas as principais infrações, segundo o auditor fiscal que acompanhou a operação, foram a ausência de água potável no local de trabalho e a existência de uma ligação comercial entre o contratante e o empregado, que impedia que os trabalhadores saíssem do local por estarem sempre em dívida com o contratante. Relatórios da pastoral da terra e denuncias de sindicatos demonstram que há muitos mais casos como esse no estado de São Paulo que seguem impunes.

A constituição Federal prevê que irregularidades trabalhistas descaracterizam a função social da propriedade e consequentemente esta deve ser desapropriada. No entanto, assim como a maioria dos artigos da constituição que parcialmente beneficiam o povo, essa norma segue como letra morto e jamais foi cumprida. Bem diferente são instrumentos como a ação de reintegração de posse, que para beneficiar os latifundiários e criminalizar os sem terras, é sempre provida e com caráter de urgência.

Os usineiros do estado de São Paulo, heróis para o presidente Lula, e as empresas multinacionais de varejo de roupas como a C&A, seguem encabeçando as denuncias de utilização de trabalho escravo e aliciamento de trabalhadores. Porém todos continuam impunes já que gozam da complacência do governo do PSDB e do judiciário no estado, que aplica o código penal com severidade contra o povo que protesta contra as enchentes e o aumento da passagem de ônibus, mas é brando quando se trata de punir os empresários escravagistas.

O governo de Lula e PT também não ficam atrás no quesito de complacência ao trabalho escravo. O estado do Pará, da governadora petista Ana Júlia Carepa, segue liderando há anos a lista dos Estados com maior ocorrência de trabalho escravo. É provável que o Pará concentre 70% dos mais de 25 mil trabalhadores escravos que existem no país. Ao que parece, a governadora petista e uma das impulsionadoras do Fórum Social Mundial, vive tranquilamente com o trabalho escravo em seu estado.

Mais recentemente, em outro exemplo de complacencia do governo Lula com o trabalho escravo, mais precisamente em setembro do ano passado, auditores fiscais flagraram trabalho escravo em plena Obra do PAC (programa de aceleração ao crescimento) no sul do estado de Goiás. O programa que é um dos principais do governo federal e o carro chefe da propaganda eleitoral da pré-candidata petista à presidência, Dilma Rousseff, previa a construção da usina “salto do rio verdinho” e estava utilizando 98 operários em situação análoga a de escravo em sua obra no estado goiano. O grupo Votorantim, do empresário Antonio Ermínio De Morais, era o responsável pela obra, e mesmo usando mão de obra escrava, foi “agraciado” pelo governo federal com R$ 250 milhões de reais (via BNDES) para a execução da obra [3].

Todos estes fatos mostram bem a face mais perversa da democracia dos ricos no Brasil. Sob o signo da modernidade do agronegócio e das multinacionais instaladas no país o trabalho escravo, assim como as inúmeras irregularidades trabalhistas nas fábricas e locais de trabalho, segue sendo uma das formas da patronal brasileira seguir lucrando como nunca em cima do sofrimento dos trabalhadores. O poder público e o judiciário seguem fazendo bem o seu trabalho de administrador dos negócios da burguesia e garantem a impunidade dos escravagistas.

Isso tudo nos indica a fragilidade e inoperância do método de fazer pressão institucional ao governo e as demais instituições do poder público, mergulhadas como sempre na lama da corrupção. Nos parece que os métodos de luta da classe trabalhadora, como as greves, piquetes, ocupações de fábricas e terras, cuja eficácia é históricamente reconhecida, é o único caminho real para conseguir não só acabar com o trabalho escravo, mas também contra todas as irregularidades e casos de assédio contra trabalhadores e trabalhadoras.

Os sindicatos, organizações de direitos humanos independentes, movimento sociais e populares estão chamados a construir comissões de investigação independentes do governo e da patronal para averiguar todas as denuncias de trabalho escravo e convocar os trabalhadores a lutar pela diminuição da jornada de trabalho sem redução salarial e por um plano de obras públicas (construção de escolas, hospitais e casas populares) para garantir a criação de mais empregos regulares e com todos os direitos garantidos.

Rafael Borges é estudante de Direito da UNESP Franca.

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