Terça 23 de Abril de 2024

Movimento Operário

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Cada luta parcial é preparatória das grandes batalhas por democracia na universidade

04 Feb 2011   |   comentários

O ano na USP começou dia 03 de janeiro com a demissão de 270 trabalhadores, tema sobre o qual a Reitoria alega estar agindo por “dentro da legalidade”. Trata-se de mais uma tentativa de dividir os trabalhadores, entre aqueles que seriam os “velhos privilegiados” e os “moços sem possibilidade de ascensão”. Uma maneira distinta de divisão nas fileiras da classe trabalhadora, método que muitas patronais utilizam, com o consentimento e a conivência de dirigentes sindicais traidores, e que tem sido uma das principais ferramentas da Reitoria – tinha o mesmo objetivo quando descontou o salário de apenas um setor de trabalhadores em greve, coincidentemente parte dos setores mais precarizados e vanguarda nas lutas.
Desde então, os trabalhadores da USP - ainda que num período em que muitos se encontram de férias – organizaram uma série de manifestações, abaixo-assinados, reuniões dos trabalhadores demitidos, assembléias, alianças com setores de fora da universidade, reuniões com advogados renomados pra organizar as estratégias jurídicas. Conquistamos a reintegração de Dulce, nossa representante no Conselho de Recursos Humanos, assim como a reintegração de uma série de companheiros e companheiras que comprovaram seu ingresso na Universidade por via de processo seletivo. Este ataque vem seguido de uma nova ofensiva repressiva como demonstra a instauração de um processo administrativo - com ameaça de demissão por justa causa - contra a companheira Rosana Bullara atualmente funcionária do MAE, ativista do SINTUSP, que trabalha há mais de 30 anos na USP, defendendo ao longo de todos estes anos uma universidade pública, de qualidade e para todos, motivo real da perseguição que vem sofrendo. Esta situação nos obriga a entender e responder ao conjunto do projeto de Rodas e do governo, já que uma resposta parcial a cada um destes ataques é completamente insuficiente.

A posição de vanguarda da intelectualidade contra a “tropa de choque” do Rodas

Diante da truculência da Reitoria, os professores Fábio Konder Comparato, Francisco de Oliveira, Paulo Arantes, Jorge Luiz Souto Maior e Luiz Renato Martins escreveram para a seção “Tendências e Debates” do jornal Folha de São Paulo (27/01/2011) um texto intitulado “A USP Contra o Estado de Direito” onde, argumentavam sobre as inconstitucionalidades e ilegalidades das atitudes de João Grandino Rodas, Reitor da USP. Eles enumeram uma série de atitudes arbitrárias do Reitor que poderíamos resumir complementando: quebra da isonomia salarial entre funcionários e professores; perseguição de estudantes que lutavam por moradia estudantil; perseguição dos estudantes da exemplar luta de 2007 em defesa da autonomia universitária; criação de cursos pagos; aumento da terceirização; sustentação da omissão de socorro ao estudante Samuel (morto em frente à Reitoria sem ajuda médica); dentre uma série de medidas e atitudes que dão passos largos à privatização da USP.

Voltando à questão das demissões e as razões por trás delas, os mesmos professores afirmam, de maneira muito significativa: “O ato imotivado e, portanto, discriminatório, visou, unicamente, retaliar e aterrorizar o sindicato (Sintusp), principal obstáculo à privatização da USP desde a contestação aos decretos do governo Serra, em 2007”. Passados alguns dias, uma verdadeira “tropa de choque” da Reitoria vem, na mesma seção “Tendências e Debates”, dizer que estão agindo dentro da lei e não querem ser reprovados pelos 40 milhões de paulistas que financiam com seus impostos a Universidade. Assumem uma postura defensiva, porque é inegável que há anos não se vê tamanho autoritarismo dentro da Universidade, e a única forma de não haver “reprovação” da população toda é arrebentando com esta estrutura de poder arcaica, anti-democrática e a serviço de uma minoria de burocratas acadêmicos que atuam de acordo com os interesses de empresários sedentos pela privatização da USP e do próprio governo do Estado, não à toa dirigido mais uma vez pelo PSDB.

A posição de vanguarda destes professores e intelectuais dá nova força ao nosso movimento, e deve ser parte de fortalecer um grande movimento democrático, que no fundo coloca em questionamento superior o regime e a democracia dentro da universidade. Para o Sintusp isso significa não somente lutar por uma Estatuinte Livre e Soberana, mas também para que a partir deste processo de discussão profunda com os três setores da universidade consigamos impor, junto à nossa mobilização, a dissolução do Conselho Universitário e sua substituição por um governo tripartite (composto por estudantes, funcionários e docentes), e o fim do vestibular – o que estará diretamente ligado à necessária estatização das universidades privadas e mais verbas para a educação pública. Nós, da LER-QI defendemos a posição, dentro e fora do Sindicato, que este governo tripartite seja com maioria estudantil, expressando a real composição da universidade. Nesta luta pela democratização radical da universidade (em seu acesso, na produção de seu conhecimento e contra a estrutura de poder completamente autoritária) queremos nos somar a todos os setores explorados que hoje estão do lado de fora dos muros da universidade, segregados nas favelas, com péssimas condições de trabalho e estudo a quem de fato a universidade deveria estar a serviço.

O Sindicato de Trabalhadores da USP e sua tarefa na defesa da universidade pública e gratuita

A luta, portanto, não termina na defesa de todos os companheiros que estão sendo atacados, ou em cada luta parcial. Trata-se de encarar a luta pela democracia na universidade, lutando de forma intransigente pela reincorporação imediata de todos os demitidos, exigindo a anulação imediata do Processo Administrativo contra a companheira Rosana Bullara, a retirada de todos os processos contra estudantes e trabalhadores e a reintegração de Brandão. Mas que isso seja parte de demonstrar a todos os estudantes e professores que a nossa luta é pela qualidade de ensino; pela ampliação de vagas públicas e presenciais; contra a precarização do trabalho que escraviza, humilha e divide; para que o ensino não seja virtual e sim presencial; para que os estudantes, professores, trabalhadores (inclusive os que atualmente são terceirizados) decidam sobre os rumos da universidade, colocando seu conhecimento a serviço das necessidades da maioria da população e não a serviço do capital.

Para isso, o Sintusp conquistou posições avançadas no movimento sindical brasileiro, tendo construído uma frente-única com estudantes combativos, intelectuais e parlamentares que são hoje o embrião desta luta democrática, aonde a presença das entidades representativas como a Adusp e o DCE tem fundamental importância. A tarefa primordial, portanto, é, através da democracia operária e da organização desde a base dos trabalhadores, avançar em uma enorme campanha contra a privatização da universidade e em defesa de democracia, o que só poderá se concretizar se conseguimos preparar toda a universidade para impor uma Estatuinte Livre e Soberana, abrindo entre todos os trabalhadores e professores, entre os estudantes que ingressaram na Universidade e os milhares de jovens que ficam fora, o necessário e urgente debate sobre a estrutura de poder e como tomar em nossas mãos a Universidade que toda a população sustenta com seus impostos.

Chico de Oliveira: “O Sintusp é uma novidade no movimento sindical brasileiro”

No último dia 02 de fevereiro, houve uma reunião de comando de mobilização no SINTUSP, com a presença de funcionários representantes de unidade, diretores e ativistas do SINTUSP, moradia retomada do CRUSP, DCE, ADUSP, professores e intelectuais, além de parlamentares como o deputado estadual Carlos Gianazzi (PSOL) e Plínio de Arruda Sampaio (candidato à presidência da república em 2010 pelo PSOL), com o objetivo de construir a mobilização contra as demissões, expulsões e o projeto privatista do reitor da USP.
Em entrevista após a reunião, Francisco de Oliveira, 77 anos, professor emérito da USP destacou que o projeto do reitor da USP está “engolfado” no processo privatista de FHC e Lula, prontificando-se a somar-se na mobilização e na luta encabeçada pelo Sintusp, que considera um exemplo de sindicalismo não corporativista e um importante defensor da universidade , o que em sua avaliação pode reanimar outros setores da maior universidade do Brasil.

Leia abaixo a entrevista na íntegra.

“O caminho que o reitor da Universidade de São Paulo está tomando, se inscreve dentro do quadro que é o resultado dos últimos 16 anos de neoliberalismo e capitalismo predatório. O período do Fernando Henrique ao qual seguiu no período do Lula, cujo as orientações são privatistas, não são estatizantes. Tem se confundido muito, o governo Lula particularmente, como um governo estatizante. Ele não foi nada disso. Ele foi um governo privatista. A USP está engolfada neste processo.

Com a quebra de alguns movimentos importantes na universidade, restou o SINTUSP que é um movimento que não é corporativista, surpreendente o SINTUSP, que na verdade é um movimento republicano. O objetivo dele tem sido tentar defender o caráter republicano da universidade. Isso é uma enorme novidade no panorama sindical brasileiro, e vem em boa hora porque as resistências na sociedade estão caindo por todo o canto. De modo que eu louvo esta capacidade que o SINTUSP tem revelado de abrir novas formas de luta, com um objetivo que ultrapassa a dimensão corporativa de muito. É uma novidade no movimento sindical brasileiro, e espero que isso tenha efeito para reanimar outros setores da própria universidade.

Mas de qualquer forma, é um processo longo, mas há tarefas urgentes e prioritárias, entre as quais eu escrevo a capacidade que se possa ter para obrigar esse reitor a renunciar, ou então tornar a vida dele impossível. É possível. É uma guerra longa pra mim, de desgaste, porque o outro lado está muito bem armado, e não há recursos jurídicos a mão que pudessem ser utilizados. Já se examinou, dirigentes da faculdade de direito [da USP], e infelizmente não há recursos jurídicos. Então tem que ser mesmo a capacidade organizativa, e a capacidade de agregar gente à um movimento desse tipo, e não é nada fácil. Até porque, já foi um termo muito usado na história do século XX, até porque é uma apunhalada pelas costas. Pois é, a universidade parada, de férias, com os docentes de férias, a universidade desmobilizada completamente, só restou mesmo o sindicato de funcionários, que está dando uma demonstração de republicanismo, e é uma novidade no movimento sindical brasileiro. Eu estou aqui e estarei fazendo o que eu posso fazer, o que é muito pouco mas contem comigo.”

Veja Tambem:

 vídeo - entrevista com Chico de Oliveira

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