Quinta 25 de Abril de 2024

Juventude

MINHA CASA, MINHA MORTE: DO DISCURSO À REALIDADE.

A verdadeira situação dos homens e mulheres que constroem o “país do futuro” e o apoio dos estudantes de Marília na sua luta.

31 Mar 2011   |   comentários

Os estudantes da UNESP/Marília dão mais um exemplo de um movimento estudantil aliado aos trabalhadores. Após a denúncia, feita por um jovem trabalhador universitário, das situações precárias de trabalho na construção de um conjunto habitacional do programa Minha Casa, Minha vida, no bairro ao lado da Universidade, os estudantes das Ciências Sociais e da Moradia Estudantil (que fica ao lado da obra), junto com estudantes de outros cursos estão desde a última quarta-feira (23/03), apoiando a mobilização dos trabalhadores que denunciam condições desumanas de trabalho.

A situação na obra chega ao extremo de os trabalhadores encontrarem ratos mortos e larvas de moscas na comida servida pela empresa de alimentação - terceirizada pela construtora - além de inúmeras irregularidades trabalhistas, quebra de contratos e condições insalubres, com refeitórios instalados em cima de sanitários e acidentes de trabalho constantes. As reivindicações dos operários tocam ainda elementos básicos, como, equipamentos de proteção individual - botas para concretagem que a empresa se nega a ceder - com alguns trabalhadores tendo seus pés queimados em carne viva, ou ainda, o fornecimento de água potável!

Respondendo ao chamado do estudante que trabalha na obra, cerca de outros 25 estudantes, ajudaram no chamado da assembléia dos trabalhadores, avisando os operários do turno da manhã que chegavam na obra, parando os ônibus e conversando com os que chegavam a pé ou de moto. Na tarde da mesma quarta, cerca de 90 trabalhadores do turno da tarde ficaram de braços cruzados na frente da obra, denunciando para a imprensa da cidade a situação desumana do canteiro de obras. Na noite de quinta, a partir de passagem em salas de aula na universidade, foi arrecadado uma quantia revertida para a confecção de panfletos que os trabalhadores distribuíram para o restante de seus companheiros dentro da obra.

Em Marília a construção civil ocupa um espaço cada vez mais destacado na economia da cidade, sendo já um dos principais empregadores, com obras previstas de quase 4.500 casas populares. Só na obra do Jardim Cavalari (próxima a Universidade) são cerca de 1300 moradias com quase 1000 operários trabalhando dia e noite no canteiro de obras. As denúncias de irregularidades e de trabalho precário já vêm sendo noticiada desde o começo do ano na cidade, quando em outra obra cerca de 120 trabalhadores denunciaram ao ministério do trabalho outras construtoras.

Longe de constituir casos isolados, assistimos neste momento em todo país cerca de 80 mil trabalhadores das obras do PAC (programa que o Minha Casa, Minha Vida faz parte) de braços cruzados, tendo o caso mais emblemático nas obras das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio em Rondônia, onde os trabalhadores se rebelaram contra o regime de semi-escravidão imposto pela Camargo Corrêa e outras construtoras. Em Pernambuco, palco, segundo a Folha de São Paulo, de uma verdadeira “Revolução Industrial” a construção do estaleiro de Suape (maior símbolo de desenvolvimento da região), se encontra paralisada, com cerca de 34 mil trabalhadores de braços cruzados que têm de lutar não só contra o despotismo das empreiteiras mas também com a repressão do próprio sindicato, com o relato de um operário atingido com um tiro na cabeça por um bate-pau. Embora este trabalhador tenha conseguido sobreviver, um de seus companheiros acabou sendo assassinado pelos capangas da empresa.

Condições insalubres, regime de semi-escravidão, repressão armada da burocracia sindical e apoio das policias locais: é por cima dos direitos básicos dos trabalhadores que se constrói o programa de Dilma para a habitação. Na Usina de Jirau, por exemplo, o Governo Federal, atendendo ao chamado do governador de Rondônia e do próprio presidente da construtora Camargo Corrêa - como relata a matéria da ISTO É[1]-, Antonio Miguel Marques, em acordo também direto com a CUT e a Força Sindical, mobilizou as Tropas da Força Nacional de Segurança criando um verdadeiro campo de concentração na cidade de Porto Velho, impedindo que os trabalhadores pudessem sair dos alojamentos, com escolta armada nas portas dos galpões e por toda a cidade. Em Marília, no mesmo dia da paralisação dos trabalhadores da obra do Jardim Cavalari, a Policia Militar entrou na obra quando a chefia impedia que os trabalhadores batessem o ponto, numa clara intimidação aos operários que tinham acabado de paralisar pelo menos 1/3 do turno.

Carro chefe da campanha eleitoral, o programa habitacional do governo Dilma, longe de responder o problema estrutural do déficit habitacional do país, busca antes de tudo encher o bolso dos grandes monopólios de construção civil nacional e internacional, como a Odebrecht, Camargo Corrêa e outras como a multinacional mexicana HOMEX que atua aqui em Marília. Grandes financiadores de campanha, estas estão de mãos dadas com o governo do PT e com as burocracias sindicais, com a CUT e a Força Sindical atuando como comissários do governo, defendendo a volta ao trabalho nestas obras para não atrasar o PAC! Em Marília, o Sindicato da Construção Civil resumiu a passar 15 minutos ouvindo as reclamações dos trabalhadores e garantindo que em poucos dias o Ministério do Trabalho estaria por lá! Papel criminoso de um instrumento que deveria ajudar e dar apoio a estes trabalhadores que colocam em risco a subsistência de suas próprias famílias ao se colocarem em luta!

Longe de representar um Brasil Potência, os canteiros de obras destes conglomerados demonstram a verdadeira face do crescimento econômico do último período, pautado em grande medida na super-exploração e precarização do trabalho e na cooptação das principais centrais sindicais para os cargos de alto escalão e para a ante-sala dos grandes empresários.

A situação fica mais crônica ainda no caso dos trabalhadores da construção civil, já que os canteiros de obra no Brasil são os que mais matam em todo o mundo. Como aponta o jornal O Globo, “Tanto em complexas obras de infraestrutura, como hidrelétricas, como nas mais simples, incluindo as do programa Minha Casa, Minha Vida, a morte está presente... Os acidentes fatais são causados principalmente por choques, soterramento e quedas. São mortes "invisíveis", que não estão nos bancos de dados dos diversos controles governamentais criados para acompanhar o PAC”[2].

A situação ainda tende a piorar com a recente afirmativa de que grande parte das obras para o mundial de futebol de 2014 e das Olimpíadas de 2016 será realizada pelas construtoras americanas que vieram na comitiva junto com Obama. Estas, principalmente, não se importarão nem um pouco com a continuidade das mortes de inúmeros trabalhadores nestes canteiros, ou ainda, em servir lavagem para estes comerem, como a mexicana HOMEX já faz por aqui.

É necessário que o movimento estudantil levante uma ampla campanha contra a precarização do trabalho dentro e fora da Universidade. A juventude não pode se calar frente a morte, mutilação e super-exploração de milhões de trabalhadores, sendo ela mesmo quem ocupa grande parte dos trabalhos informais e precários! O apoio a luta dos trabalhadores da HOMEX deve ser a continuidade da exemplar luta contra a terceirização do R.U noturno no ano passado[3].

Denunciemos as burocracias sindicais da CUT e da Força Sindical que compactuam com campos de concentração para os trabalhadores de Jirau e que matam os companheiros em Suape! Que a CSP-Conlutas levante uma campanha e intervenha na defesa das condições de trabalho dos trabalhadores do PAC e do restante da construção civil! Pela formação de comitês nos canteiros de obras para que os companheiros possam discutir e se organizar contra essas condições! Pelo fim da terceirização! Incorporação imediata dos companheiros das empresas terceirizadas sem concurso público! Salário mínimo do DIEESE!

Façamos através da ANEL uma grande campanha no movimento estudantil em defesa desses trabalhadores e denunciemos as burocracias da UNE e do PT e PCdoB que se calam frente a esta situação embelezando o governo de Dilma perante os estudantes! Que o apoio dos estudantes de Marília, que estão fazendo uma campanha dentro e fora da universidade, denunciando a situação dos trabalhadores e os ajudando diretamente na sua mobilização, seja um exemplo para a juventude de todo o país!

[1] CEO da Camargo enfrenta seu maior desafio. ISTO É. Nº edição: 703 | Capa | 25.MAR - 21:00

[2] Mortes em obras do PAC estão acima dos padrões. O Globo. 26/03/2011 às 19h50m.

[3] Em junho de 2010, a partir da tentativa da diretoria da UNESP/Marília em terceirizar o restaurante universitário no período noturno, os estudantes da Ciências Sociais e da Filosofia decretaram greve em seus cursos e impulsionaram a ocupação do prédio da Diretoria da Faculdade. Depois de quase duas semanas de ocupação a diretoria retrocedeu, contratando os novos trabalhadores via CLT. Para saber mais dessa importante luta: http://www.ler-qi.org/spip.php?article2454

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