Quinta 28 de Março de 2024

Movimento Operário

METROVIÁRIOS

A verdadeira “Zorra” é criada pelo governo, a mídia e o machismo

20 Oct 2011   |   comentários

Frente aos assédios sexuais no Metrô-SP, a campanha do Sindicato dos Metroviários contra o programa “Zorra Total” da TV Globo e as declarações da Secretaria Nacional de Mulheres.

A discussão sobre o assédio sexual no metrô de São Paulo se transformou num debate nacional. Toda a imprensa divulga e discute o quadro “Metrô Zorra Total” do programa “Zorra Total” da TV Globo , após denúncia do Sindicato dos Metroviários – SP ao caráter machista de referido quadro e a exigência de que o quadro seja tirado do ar. Até mesmo a Secretaria Nacional de Enfrentamento à violência contra as Mulheres, do governo Dilma, se posicionou sobre o assunto. Frente à importância da luta contra a violência e assédio às mulheres e ao debate que se abriu, queremos com esse artigo discutir mais profundamente quais as medidas que as trabalhadoras e trabalhadores devem tomar nessa situação, debatendo também com a posição expressa pelo PSTU e o PSOL a frente do Sindicato do Metroviários – SP.

A superlotação do metrô e a conivência do governo de São Paulo são as principais causas do assédio

O Metrô de São Paulo é hoje um dos mais caros e lotados do mundo, com quase 4 milhões de usuários por dia e uma rede de linhas totalmente insuficiente para dar conta dos trabalhadores e trabalhadoras que precisam chegar aos seus locais de trabalho e estudo. O governo do PSDB no Estado propagandeia o Metrô como um meio de transporte seguro e rápido, mas esconde as atrocidades a que a população é submetida e as condições sub-humanas do transporte público na principal capital do país. Com a vinda ao Brasil das Olimpíadas e da Copa do Mundo, o governo protagonizou uma expansão das linhas, privatizando a Linha 4-Amarela, sem qualidade, sem segurança operacional e sem a devida expansão do número de funcionários para prestar um bom atendimento à população. Já não é mais novidade os problemas e falhas do Metrô nos horários de pico, inclusive na recém inaugurada Linha 4, que fazem a população chegar atrasada no trabalho, pagando um preço absurdo por isso e muitas vezes tendo seus dias de trabalho descontados no salário.

Como se não bastasse essa situação, o governo do Estado e a direção do Metrô são coniventes com o machismo que se expressa da forma mais brutal na superlotação a que os usuários são submetidos todos os dias, se calando frente ao assédio sexual sofrido pelas mulheres. Desde o início de 2011, já são mais de 40 casos de denúncia de mulheres que sofreram esse tipo de agressão. Para mascarar os números, a Delegacia de Polícia do Metropolitano (DELPOM), orientada pelo Metrô, muitas vezes relata no Boletim de Ocorrência as agressões como “importunação” simplesmente, deixando totalmente impunes os agressores. Além disso, o tratamento dado pela DELPOM às mulheres vítimas de assédio no Metrô, assim como se dá nas Delegacias de Polícia fora do Metrô, é o pior possível, desacreditando dos relatos dessas mulheres e constrangendo-as a não levar adiante a denúncia. Por aí se vê que os mais de 40 casos não expressam o número real, que é muito superior, pois são daquelas mulheres que, além de enfrentar a humilhação de serem assediadas, ainda tiveram coragem de enfrentar o machismo dos policiais que as atenderam, e levaram adiante a denúncia, ainda quando os casos são registrados como “assédio sexual”.

Por isso não podemos concordar quando o Sindicato dos Metroviários orienta as mulheres agredidas a procurar a DELPOM. Não devemos ter nenhuma ilusão de que o governo do Estado e o Metrô, nem a DELPOM, irão defender as mulheres. Apenas as mulheres usuárias do Metrô, junto com as metroviárias e a população trabalhadora auto-organizadas, podem dar um fim a essa situação. Expansão com qualidade e sem privatização já! Contratação de mais funcionários no Metrô! O Sindicato dos Metroviários deve organizar uma comissão independente de mulheres usuárias e metroviárias para investigar as denúncias! Punição de todos os agressores!

O caráter reacionário da imprensa - veiculando a ideologia machista e calando as trabalhadoras e trabalhadores

O quadro “Metrô Zorra Total” da TV Globo, apesar de ser escrachadamente machista e reacionário, não é um fato isolado. O que vemos todos os dias nos principais meios de comunicação burgueses, nos jornais, novelas etc, são as mulheres apresentadas como uma mercadoria, submetidas a um padrão de beleza racista e a veiculação de todo tipo de ideologia opressora às mulheres. Isso não é à toa. A rede Globo, assim como o conjunto das mídias controladas pela burguesia, está a serviço de alienar os trabalhadores e trabalhadoras, cumprindo um papel fundamental para que nossa classe não se revolte contra a sociedade de exploração e opressão, que se utiliza do machismo para dividir os trabalhadores e melhor nos explorar.

A grita pela “liberdade de imprensa” desses meios de comunicação está a serviço disso. Ao mesmo tempo, os trabalhadores e trabalhadoras, a partir das suas organizações e sindicatos, não têm nenhum espaço nos meios de comunicação de massas para se expressar. Por isso consideramos legítima a indignação das mulheres frente ao quadro da TV Globo. Nesse sentido, não podemos concordar com o Sindicato dos Metroviários quando, através da sua Secretaria de Assuntos da Mulher, em sua carta, reivindica a TV Globo como “respeitável emissora” , citando seus princípios editoriais que “repudiam todas as formas de preconceito”. Não devemos ter nenhuma confiança nos “princípios editoriais” da TV Globo, nem achar que vão defender as mulheres. Nossa luta deve ser para desmascarar o papel da grande mídia burguesa em seu conjunto. O Sindicato dos Metroviários deve exigir espaço na TV para ter um direito de resposta e denunciar o programa “Zorra Total”, o machismo veiculado pela televisão, assim como o caráter anti-democrático da imprensa, onde as trabalhadoras e trabalhadores não tem voz.

A hipocrisia do governo Dilma e sua Secretaria de Mulheres

Após a campanha protagonizada pela Secretaria de Assuntos da Mulher do Sindicato dos Metroviários contra o assédio sexual no Metrô e a carta protocolada na TV Globo exigindo a retirada do quadro “Metrô Zorra Total” do ar, a Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres enviou uma carta ao Sindicato dos Metroviários . Nessa carta, a Secretária Aparecida Gonçalves expressa que: “De fato, sabemos que os meios de comunicação são portais de formação para a sociedade e que pelos seus alcances podem compactuar com os conceitos que desqualificam as mulheres e reafirmam a desigualdade de gênero de forma massificada. Assim sendo, apoiamos a campanha de conscientização da sociedade, em especial à população que utiliza o metrô como meio de transporte, e ratificamos a solicitação junto à emissora para que o quadro seja re-significado ou retirado de sua programação”.

O governo Dilma do PT, através de sua Secretaria de Mulheres, vem agora cinicamente dizer que defende a luta contra os meios de comunicação reacionários que veiculam o machismo. Mas não dizem que esse é o mesmo governo que faz vista grossa ao assassinato de mais de 10 mulheres por dia vítimas de agressão machista. É o mesmo governo que faz a propaganda do Brasil que avança, apoiado na precarização do trabalho de milhões de mulheres no país, que são as que tem os salários mais baixos. Por isso não caímos nesse discurso de apoio às mulheres que agora a Secretaria Nacional faz.

A referida Secretaria Nacional diz que “reconhecemos a boa-prática do Sindicato e congratulamos suas ações em prol do enfrentamento à violência contra as mulheres. Registramos aqui nosso apreço e gratidão.” Como pode o governo federal “reconhecer a boa-prática” do Sindicato dos Metroviários quando está participando, junto ao governo estadual, dos ataques à categoria dos metroviários? O governo Dilma gasta milhões para construir o Trem de Alta Velocidade (TAV), que ligará Campinas-São Paulo-Rio de Janeiro, que custará o preço de passagem de avião, enquanto com o mesmo valor poderia duplicar a rede de Metrô em São Paulo. O governo federal que empresta, através do BNDES, milhões a juros baixíssimos para o consórcio CCR- Via Quatro privatizar a Linha 4-Amarela, mesmo consórcio para o qual o governo Lula vendeu as estradas federais, precarizando o trabalho dos Metroviários e dividindo a categoria. É esse governo que “reconhece a boa-prática” do Sindicato dos Metroviários? Definitivamente, não queremos esse reconhecimento cínico do governo.

Por isso não concordamos que o Sindicato dos Metroviários reivindique esse apoio do governo acriticamente, publicando em seu site uma nota que diz que “governo federal apóia iniciativa do Sindicato dos Metroviários”. Frente ao suposto apoio do Governo Dilma e da Secretária Aparecida Gonçalves, o sindicato deveria soltar uma nota onde justamente desmascarasse esse discurso mentiroso e hipócrita, mostrando como o apoio de palavra a uma atitude específica do sindicato para tirar o quadro da TV Globo do ar não significa nada perto do que esse governo tem significado para a vida das mulheres trabalhadoras.

[1] Se trata de um quadro em que as personagens “Valéria e Janete” estão num vagão do Metrô lotado e uma delas começa a ser assediada por um passageiro, se sente incomodada e reclama à amiga, que diz a ela para aproveitar a oportunidade.

[2] Acesse a carta: www.metroviarios.org.br/site/images/documentos/cartamulheres_globo.pdf

[3] Acesse a carta: www.metroviarios.org.br/site/images/documentos/cartamulheresgovfederal1.pdf

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