Sexta 19 de Abril de 2024

A última agitação política e as novas posições do imperialismo

06 Sep 2005   |   comentários

O Empréstimo de 20 milhões de libras, ao mesmo tempo que liquidou a política de valorização do café, suprimiu os anseios “revolucionários” de parte da burguesia brasileira cindida na luta pela presidência da República. Não foi a entrevista célebre de Irapunzinho, onde o sr. Borges de Medeiros, megatério [grande mamífero desdentado pré-histórico] positivista e cheio burguês consciente, mostrou que “só tinham a ganhar com a revolução os que não tinham nada” , nem as reticências do Partido Republicano do Rio Grande do Sul, premido entre as atitudes do sr. Paim Filho e os 80 mil tiros que o mavórtico [Marte, deus da guerra] despachou para a pequenina e heróica Paraíba pensando que da confusão saísse o “duce” , nem o recente telegrama do sr. António Carlos, o qual deu forma ao “recuo de Minas” , passado ao mesmo Aranha, nem a saída deste da governança, nem o braço forte do governo federal. Esses foram os atos em que se exteriorizou a autonomia política desta vasta semi-colónia. Os córdeis que tangiam manipansos [ídolo africano] da política burguesa, eram seguros pela finança internacional que manejava a seu talento, a crise política conseqüente à crise económica em que se debate o Brasil.

Foram remédio às cólicas revolucionárias da burguesia nacional os 20 milhões esterlinos conseguidos pelo Instituto do Café de S. Paulo, dos banqueiros de Londres, Nova York e outras paragens mais pitorescas que a gente está acostumada a considerar centros de turismo, onde há sempre mais-valia a capitalizar e burguesia “ingênua” de olhos gulosos em busca de uma taxa de juros mais alta, sem se incomodar muito com as possíveis catástrofes na economia brasileira. É peculiar à burguesia em todo o mundo semelhante ingenuidade. Quem se assustar com os plano de “revolução democrática da burguesia grande ou pequena, dos países coloniais, nem mesmo na última edição, novinha e em folha, feita em Moscou, para uso sul-americano, hindu, egípcio, apoiada em mirificos exemplos. Revoluções agrárias e anti-imperalistas, o capitalismo imperialista tem-nas visto e boas...É mesmo uma daquelas contradições dialéticas que a burguesia tenta resolver com cruzeiros de boa vontade nas eras pacífica e, de quando em quando em vez, suscitando algum general descontente com o desenvolvimento histórico.

Mas o que convém precisar no momento é a significação do empréstimo internacional, como ele repercutirá nas condições de produção cafeeira e na situação brasileira em geral, nas relações da burguesia nacional com a burguesia imperialista.

Embora os escribas do Instituto, oficiais e oficiosos, jurem que não houve solução de continuidade na política cafeeira, que o financiamento da produção re-encetado depois de 1 de Julho em “novas bases” (40$ por saca), o foi dentro do mesmo plano já estabelecido, é preferível fiar-se mais na informação inglesa ou yankee.

Fala-se aí com a segurança de quem segura as chave da burra do capital financeiro internacional. O boletim de informação de Nortz & Cia. (Nova York), tratando das negociações de então para o empréstimo declarava: “Telegramas particulares de fonte aparentemente desautorizada, tornam claro que se pensa em São Paulo que os novos arranjos com os banqueiros significarão apenas uma nova forma de continuar a polícia passada de defesa e essas notícias causaram alguma inquietação no nosso comércio pois elas parecem indicar a suposição de que há meio de fugir ao claro sentido das clausulas do empréstimo. Os meios comerciais confiam em que os Banqueiros, informados de tais tendências, providenciarão no sentido de eliminar todas as escapatórias dessa espécie.” É claro que os Banqueiros não esperavam por essa advertência para ditar um amável contrato pelo qual o governo de S. Paulo “consente em não mais acumular café, direta ou indiretamente, exceto de acordo com os banqueiros e com ulteriores garantis para o Empréstimo” , sendo também estabelecido que “um mínimo de dez milhões de sacas, será vendido anualmente de modo que, no fim do prazo aproximado de 10 anos, todo o “stock” de café tenha sido lançado no mercado” .

Isto é a falência de mais um plano de valorização a custa do mercado yankee, outra vitória “incruenta e pacífica” dos Estados Unidos sobre as valorizações julgadas artificiais, é claro, quando o produto não está sob o seu controle. Depois da borracha e do cobre, chegou a vez do café.

É tempo pois de rever a apocalíptica “teoria do P.C.B, revelada como religião, dogma indiscutido e indiscutível, cujo segredo e explicação só possuem os “eleitos” do comitê central, e repousa sobre estas igualdades fundamentais: S. Paulo (feudal) café, igual imperialismo inglês; Indústria + Movimento Liberal igual imperialismo yankee. A guerra civil ao fim da luta eleitoral. Mas os teóricos do P.C.B só apreendem a realidade quando se traduz pela fisionomia do indivíduo A ou X, ou literalmente por documento escrito. É o caso de pór-lhes em frente do sr. António Mello Franco, delegado de Minas viajando de Nova York para Londres e vice-versa, suplicando um empréstimo recusado por falta de endosso do Governo Federal, ou mostrar-lhes o contrato do empréstimo paulista onde o capital yankee participa com a cota de 35 milhões de dólares. Até parece mentira, dirão os “fiéis” . Talvez só para prevenir o espanto dos dirigentes do P.C.B., segundo os jornais dos Estados U idos, foi alegada, durante os arranjos para o empréstimo a existência de um documento de 1905 firmado entre os banqueiros Schroeder de Londres e a “National City” de Nova York” dando a esta o direito de participar dos futuros empréstimo ao Estado de São Paulo.

Desaparecido e esquecido nos arquivos da City , deu agora sinal de si...se non é vero é ben trovato...sobretudo para os sábios economistas do Partido que poderão dizer: “Ninguém poderia adivinhar” .

Mas o modesto militante que não receie se (ilegível) da sua cabeça para pensar e que não queira enxergar tudo só através das lunetas da Comissão Central do P.C.B., pude refletir que, controlado o mercado de café pela garantia de serem liquidados os stocks atuais em 10 annos, e escoadas as safras de futuras de acordo com um plano preestabelecido o qual obriga a venda de duas safras subseqüentes no prazo máximo de dois anos; regulados os preços pelos interesses dos comerciantes de Nova York, o maior mercado de café, controlada a própria produção pela imobilização de parte do empréstimo em hipotecas de fazendas, compreende-se perfeitamente, porque Wall Street, desta vez se mostrou tão solicita em acudir aos reclamos de “certos monopólios naturais” tão duramente tratados por Mr. Hoover, quando secretário do Comércio, em 1925, negando licença para o lançamento em Nova York, de um empréstimo para o Instituto do café. Será Mr. Hoover, presidente diferente de Mr. Hoover secretário? De certo os interesses primordiais da burguesia yankee relativamente à América do Sul não mudaram: a monopolização desta parte do mundo como produtora de matérias primas e como escoadouro para a sua formidável produção industrial a qual não pode deixar de tender para a abertura pacífica ou guerreira de novos mercados. De como se dá essa penetração “pacífica” do capital yankee no Brasil tem mais consciência o cónsul dos Estados Unidos em São Paulo do que as resoluções da I.C. e do P.C.B. que pregam uma abstrusa concepção de imperialismo a qual leva direito à “ação anti-imperialista” (manifestos, ligas e partidos), caminho certo pelo pior confusionismo ao “putschismo” (por exemplo, o caso recente da Bolívia). Mas, dizia, Mr. Cameron num banquete, aos seus convivas: “Maravilho-se, quando ao olhar para as grandes avenidas e arranha-céus em construção nesta cidade em franco crescimento, penso que, em grande parte, o capital dos meus compatriotas coopera em todo este progresso. Medido pelo movimento do porto de Santo o comércio entre os Estados Unidos e o Estado de São Paulo, vemos que no qüinqüênio passado, S. Paulo ficou com excesso de 500 milhões de dólares, isto é, os Estados Unidos mandaram para aqui automóveis, máquinas, pilares e outras mercadorias e mais 100 milhões de dólares anualmente para pagar o seu café. É certo que os melhoramentos de São Paulo se devem em grande parte ao ouro dos Estados Unidos.”

A fase imperialista da acumulação é caracterizada pela exportação do capital mas também é a fase da industrialização e emancipação capitalista dos países coloniais ou semi-coloniais, isto é, as regiões à custa das quais os países capitalistas, a burguesia imperialista, realiza a acumulação da mais valia. É uma fase revolucionária porque no processo de emancipação capitalista é forçoso quebrar as formas de Estado pré-capitalista para se criar a forma de dominação de classe mais conforme às exigências da produção capitalista. Até aí chega a consciência revolucionária dos “leaders” do “anti-imperialismo” e....do P.C.B. Mas incapazes de pensar dialeticamente e agir conseqüentemente, essas correntes subestimam as novas contradições que ameaçam, no próprio desenvolvimento da revolução nacional, a dominação do capital, entravando os seus objetivos imediatos. Estas contradições se concretizam pela ação revolucionário do proletariado ’ o que, lutando pelas próprias aspirações, dá forma e sentido a insurreição das massas oprimidas e estabelece a ligação com a revolução internacional. É por isso que cumpre a analisar a pressão imperialista, referindo-a à situação relativa das classes.

É preciso abandonar o simplismo ridículo das teses do 3º Congresso do P.C., quando se referem ao imperialismo inglês cavalgando a burguesia agrária e feudal (!) de S. Paulo em oposição ao “jovem e irresistível imperialismo rival yankee” (?!) Onde estás, ó precisão marxista?

A idéia abstrata da opressão nacional é base do pior confusionismo. Bernardes fala em imperialismo e nega a concessão de Itabira, António Carlos falando em revolução pela siderurgia, o “Diário Nacional” , órgão dos democráticos, abre campanha contra a alienação das nossas quedas d”™água a companhias estrangeiras. Luiz Carlos Prestes fala “atividade prejudicial do capitalismo estrangeiro ao país, ao esforço nacional” . A ideologia “anti-imperialista” concebe o jugo do imperialismo como uma ação mecânica, exterior, única sobre todas as classes das colónias. A oposição comunista nas discussões sobre a revolução chinesa denunciou esse erro grosseiro e, via-se logo, fatal. A luta revolucionária contra o imperialismo não cria uma coesão das classes na colónia mas é, no contrário fator de diferenciação política. A força do imperialismo reside na ligação económica e política do capital estrangeiro com a burguesia indígena.

O P.C.B. tem saltado da coceira “kuomitanguista” de 1927 à Coluna Prestes, da aliança orgânica à ligação com a vanguarda da pequena burguesia (?), do “Agrarismo e Industrialismo” do camarada Brandão à última “pastoral” da I.C. sobre a questão brasileira.

Por este último modelo de previsão marxista tem-se idéia de que podem ser a teoria e a prática do Setor brasileiro. Mas nós sabemos todos que este não tem desmerecido o quartel general.

LYON (Lívio Xavier), Luta de Classe, n.3, Junho de 1930









  • Não há comentários para este artigo