MOVIMENTO OPERÁRIO
A posição dos revolucionários sobre os “planos de carreira”
16 Sep 2011
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“Ao mesmo tempo (...) a classe operária não deve exagerar a seus próprios olhos o resultado final destas lutas diárias. Não deve esquecer-se de que luta contra os efeitos, mas não contra as causas desses efeitos; que logra conter o movimento descendente, mas não fazê-lo mudar de direção; que aplicam paliativos, mas não cura a enfermidade. (...)” [1]. Marx define toda a história da humanidade a partir da compreensão das contradições materiais que movem as diferentes classes sociais a um conflito irreconciliável a que denomina luta de classes. A burguesia, proprietária dos meios de produção e o proletariado, obrigado a vender sua força de trabalho, constituem a base material da sociedade dividida em classes sociais (o capitalismo).
No capitalismo o processo de trabalho assume um caráter peculiar já que seu intuito fundamental é conseguir reverter em valor de troca todas as necessidades humanas, valorizando o capital investido originalmente através da agregação de valor produzida pelo trabalho humano. Neste processo os proprietários (patrões) pagam aos trabalhadores apenas o necessário à sua reprodução como fonte de força de trabalho sob a forma de salário, acumulando de maneira privada (para si) a maior parte do produto do trabalho humano não pago (mais-valia). Estas definições feitas por Marx há quase dois séculos nos permitem entender que o trabalho assalariado longe de ser “natural” corresponde aos interesses materiais de uma classe, significando a possibilidade do lucro para os capitalistas e uma prisão para os trabalhadores que passam boa parte de suas vidas sob inúmeras privações.
No processo de valorização, a sede de lucros da burguesia e a competição imposta pela concorrência levam a uma constante busca pelo aumento da taxa de lucro de cada capitalista que o faz através da imposição aos trabalhadores do aumento das jornadas de trabalho, da redução dos salários, ou de mecanismos que lhe permitam uma “otimização” da mesma jornada de trabalho, aumentando a produtividade do trabalho. Como definia Marx: “Ao comprar a força de trabalho do operário e ao pagá-la pelo seu valor, o capitalista adquire, como qualquer outro comprador, o direito de consumir ou usar a mercadoria comprada. (...) Portanto, o capitalista, ao comprar o valor diário, ou semanal, da força de trabalho do operário, adquire o direito de servir-se dela ou de fazê-la funcionar durante todo o dia ou toda a semana. (...) A quantidade de trabalho que serve de limite ao valor da força de trabalho (ou seja, o salário) do operário não limita de modo algum a quantidade de trabalho que sua força de trabalho pode executar” [2].
E é neste contexto que os chamados Planos de Carreira tornam-se uma ferramenta extremamente eficaz para os patrões. Neste caso o aumento da produtividade é obtido através do atrelamento dos reajustes salariais às avaliações de desempenho e de produtividade individuais, ou seja, travestindo um ataque às condições de trabalho do conjunto dos trabalhadores através de pequenas “concessões” para alguns trabalhadores. Os capitalistas calculam os preços dos produtos e os salários (da diferença entre os dois extrai a mais-valia) não pelo que “cada” trabalhador produz, mas sim pela média de todos os trabalhadores de uma empresa ou ramo de produção. Na USP a produtividade do trabalho tem que ser medida pelo conjunto de todos os trabalhadores e não por “cada um”. Com o Plano de Carreira e o PROADE a Reitoria passa a tratar a produtividade como “individual”, relativa a cada funcionário, medida pelo “seu” desempenho. Ou seja, se um determinado trabalho é realizado por uma equipe de cinco funcionários, mesmo que seu resultado final seja positivo, os funcionários serão avaliados pelo desempenho individual, fazendo com que o “trabalho final” (coletivo) tenha um valor X, mas o custo pode ser diminuído pela individualização do desempenho, permitindo à gerência de recursos humanos “punir” e até demitir funcionários, diminuindo os custos e obrigando os demais a continuar produzindo o “trabalho final” com a mesma produtividade de antes.
Além disso, os Planos de Carreira impõe aos trabalhadores o espírito de competição e individualismo alimentando a ilusão de ascensão pelo mérito individual e causando uma nefasta divisão social e política entre “eficientes” e “indolentes” ou “improdutivos”. Do ponto de vista ideológico, a “ascensão individual” pelo mérito é o que permite à burguesia alimentar a idéia de uma “conciliação harmônica” de interesses, buscando desta forma falsear a divisão da sociedade entre classes sociais. E o Plano de Carreira ataca, também, um direito histórico e fundamental da classe trabalhadora: o contrato coletivo de trabalho, que foi uma dura batalha há mais de 100 anos para garantir que os patrões deixassem de contratar os trabalhadores individualmente, pagando a cada um como queria, impondo regras individuais para extrair o máximo possível de lucro (como no século XIX e começo do século XX). Por mais que pareça uma “modernidade”, os Planos de Carreira significam um retrocesso histórico da luta dos trabalhadores, entregando aos patrões o direito de “individualizar” a relação de trabalho, o que enfraquece a força da nossa classe e dos nossos sindicatos.
Partimos destas definições para tentar demonstrar que, para os marxistas revolucionários a luta por um Plano de Carreira “justo” ou adequado às necessidades dos trabalhadores é impossível de ser atingido na medida em que os Planos de Carreira são uma armadilha travestida de concessões utilizada pelos patrões para dividir os trabalhadores e aumentar sua margem de lucro através da precarização das condições de trabalho e da imposição de metas de produtividade inatingíveis que podem levar à morte milhões de trabalhadores todos os anos.
Portanto, para os revolucionários não se trata, então, da perspectiva de “reformar” ou “melhorar” os mecanismos de exploração, mas romper com o corporativismo e passar ao questionamento das causas, combinando a necessária luta por salários, pelo emprego para todos e pela redução da jornada de trabalho, à perspectiva revolucionária apontada já em meados do século XIX: “Em vez do lema conservador de: ‘Um salário justo por uma jornada de trabalho justa! ’, deverá inscrever na sua bandeira esta divisa revolucionária: ‘Abolição do sistema de trabalho assalariado! ’” [3].
Esta posição de princípios é a que nos separa, estrategicamente, de organizações do movimento sindical que apenas formalmente denunciam os Planos de Carreira como se fosse possível “separar” os “benefícios” da carreira, como o reajuste salarial dos “ataques”, como as avaliações por competência. Dentro do próprio Sintusp, onde compomos a Diretoria junto aos companheiros do Coletivo Piqueteiros e Lutadores, consideramos fundamental abrir e aprofundar esta discussão estratégica. Afinal, os sindicatos além de defender os direitos dos trabalhadores e seu nível de vida, contra os ataques patronais e governamentais, devem servir para a luta estratégica contra a exploração capitalista, pelo fim do capitalismo e seu sistema de assalariamento e superexploração.
Lutamos por:
– Fim do Proade! Abaixo a avaliação de desempenho e o “chicote” das chefias! Estabilidade no emprego!
– Efetivação de todos os terceirizados sem necessidade de concurso público ou processo seletivo.
– Salário mínimo do DIEESE.
– Nenhuma demissão! Punição aos patrões da iniciativa privada ou pública que demitirem.
– Redução da jornada de trabalho para 30 horas semanais, sem redução de salário. Emprego pleno para todos!
[1] Salário, preço e lucro, de Karl Marx.
[2] Idem.
[3] Idem.
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