Sexta 19 de Abril de 2024

Teoria

I Congresso da LER-QI

A luta teórica contra o revisionismo como tarefa crucial dos marxistas revolucionários

09 Nov 2007 | Apresentamos abaixo uma síntese inicial de uma discussão aberta [1] entre as organizações que compõem a Fração Trotskista (FT-QI), a qual ocupou um papel destacado na definição das tarefas atuais e da orientação discutida e aprovada no I Congresso da LER-QI   |   comentários

Na atual etapa da luta de classes a nível mundial, em que o lento processo de recomposição do proletariado, particularmente de sua subjetividade, se insere numa atmosfera ideológica ainda marcada profundamente pelos anos de reação imperialista nos planos social, económico, político e ideológico, discutimos como a luta teórica se repõe como aspecto indispensável do combate marxista revolucionário.

Essa atmosfera ideológica está determinada sobretudo pelas grandes derrotas do movimento operário sobre as quais se instaurou a ofensiva neoliberal, em particular o fato de que a burocracia stalinista ter dado lugar não a revoluções políticas triunfantes, mas ao aborto dos processos populares que a questionaram a fins dos anos oitenta e seu desvio para a restauração do capitalismo. Essa situação aprofundou a crise do marxismo em níveis nunca vistos. Daí que hoje, quando os sintomas de uma reversão da correlação de forças em um sentido mais favorável à luta de classe proletária começam a se acumular, os primeiros espaços políticos que se abrem constituam uma base para novas incursões na revisão do marxismo por parte de correntes que se reivindicam trotskistas, e, inclusive, no liquidacionismo de várias dessas correntes.

A defesa dos princípios do marxismo como tarefa crucial nos momentos de reação ideológica

Precisamente porque estamos novamente numa fase de dissensões teóricas, um momento marcado por revisionismos dos mais diversos tipos e graus, é que a exaltação unilateral no pensamento de Lênin do momento do “salto” , da grande virada tática, e nesse sentido também a ênfase unilateral no efeito de ruptura provocado em seu pensamento pela guerra mundial de 1914 ’ perspectiva unilateral compartilhada por autores tão diversos como Bensaïd e Zizek, e repetida na maioria dos debates realizados por ocasião do aniversário de 90 anos da revolução russa ’ parece totalmente inadequada. Pois todos esses giros e saltos, tanto no pensamento quanto na política efetiva de seu partido, encontraram sua condição de possibilidade no longo processo de preparação que lhes antecedeu, processo no qual a delimitação teórica dos princípios do marxismo ocupou um papel fundamental.

Numa fase de reação ideológica, semelhante em vários aspectos ao momento atual, Lenin afirmou: “precisamente porque o marxismo não é um dogma morto, não é uma doutrina acabada, terminada e imutável, senão um guia vivo para a ação, não podia menos que refletir em si as mudanças assombrosamente bruscas nas condições da vida social. O reflexo desta mudança tem sido uma profunda desagregação, dispersão, e vacilações de todo tipo, numa palavra, uma crise interna sumamente grave do marxismo. A resistência decidida a esta desagregação, a luta tenaz em favor dos fundamentos do marxismo se coloca na ordem do dia (...) Não é possível ignorar os problemas que esta crise coloca. Não há nada mais nocivo, mais carente de princípios, que tratar de ignorar este fato valendo-se de frases”  [2] .

O papel da luta teórica contra o revisionismo

Para Lênin, o fato de o marxismo ter se estabelecido por um momento, a partir do último quarto do século 19, como corrente predominante no movimento operário, não significava o fim da luta contra as correntes hostis a ele. Ao contrário, desde que se estabeleceu através de um duro combate contra todas as correntes socialista pré-marxistas (tal como o neohegelianismo de esquerda, o proudhonismo e, mais tarde, o bakuninismo) o marxismo teve que enfrentar uma nova corrente hostil surgida dentre suas próprias fileiras (na década de 90 do século XIX). Uma vez que o socialismo “pré-marxista” havia sido derrotado, este seguiu lutando dentro do marxismo como revisionismo.

Lênin estabelece, combatendo o revisionismo, determinados padrões comuns que vez ou outra se repetiriam ao longo do tempo: a volta ao kantismo (como neokantismo), no qual os professores “repetiam as vulgaridades que os padres haviam pronunciado mil vezes contra o materialismo filosófico” , enquanto que os revisionistas sorriam comprazidos afirmando que o marxismo havia sido refutado há muito tempo, tratando a Hegel como “cachorro morto” e predicando o idealismo, só que mil vezes mais mesquinho e superficial que o hegeliano, encolhendo os ombros desdenhosamente ante a dialética. “Os revisionistas se afundavam (...) no pântano do envilecimento filosófico da ciência, substituindo a ”˜sutil”™ (e revolucionária) dialética pela ”˜simples”™ (e pacífica) ”˜evolução”™” .

A luta teórica contra o revisionismo hoje

A luta teórica contra o revisionismo e a luta política (isto é, programática e estratégica, com as conseqüências táticas correspondentes) contra o reformismo e o centrismo, são dois aspectos de uma mesma luta que o marxismo revolucionário deve dar continuamente se pretende que sua política seja efetiva e não queira degenerar.

Se o primeiro revisionismo do movimento operário (o de Bernstein) teve a ver, como define Lênin, com o fortalecimento do marxismo e a ligação a ele de intelectual que representavam em seu seio correntes hostis, o revisionismo atual tem a ver com todo um século de revoluções degeneradas, de criação de estados operários deformados por meio de revoluções não clássicas, e nas últimas décadas com o predomínio de uma intelectualidade acadêmica ou ligada aos setores “antiglobalização” que voltaram à teorias utópicas (distintos tipos de anarquismos, autonomismos que querem “mudar o mundo sem tomar o poder” , antiliberalismo ou inclusive “anticapitalismo” ) que naturalizam e projetam para o futuro a situação atual considerando que o capitalismo sempre encontrará alguma forma pouco traumática de sair de suas crises periódicas (como o fez nos anos 90, e depois na recessão de 2000-2001) e não que estão se acumulando as condições para a irrupção de crises generalizadas e profundas.

No momento atual, quem não atualizar o marxismo num sentido revolucionário, está abrindo caminho, por ação ou omissão, a todas as correntes (leia-se indigenismo e chavismo na América Latina, “globalifóbicos” na Europa, etc) que impedirão que o marxismo possa fundir-se com o melhor da vanguarda operária e juvenil.

A luta para construir partidos marxistas e uma internacional revolucionária é não só teórica e ideológica, como de programas e de perspectivas estratégicas com todas as diversas correntes hostis ao marxismo dentro do movimento e na sociedade em geral. Desenvolver a articulação entre a análise da situação e a dinâmica do capitalismo hoje (que deve relacionar economia, estados e luta de classes) com a atualidade do projeto de partido e programa leninistas pelo lutamos, é um dos desafios centrais que temos como FT-QI no plano teórico-político.

[1A luta teórica contra o revisionismo como tarefa crucial dos marxistas revolucionários

[2“Acerca de algumas particularidades teóricas do marxismo” , Dezembro de 1910. Grifos do original.

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