Quinta 25 de Abril de 2024

A guerra e as tarefas do proletariado do Brasil

07 Sep 2005   |   comentários

Estamos com a guerra às portas. Ainda é possível que a luta armada não se deflagre agora; de um lado, Londres e Paris aconselham a Tchecoslováquia que faça as concessões que for possível sem comprometer seriamente a sua situação no campo de aviação para os aparelhos franceses numa guerra com a Alemanha. A Inglaterra e a França não querem a guerra já, a primeira porque ainda não se considera bastante armada e porque teme a luta das colónias por sua independência e a segunda porque tem medo que seu proletariado ainda não esteja preparado para servir com docilidade necessária de carne de canhão em defesa dos sagrados “interesses” , isto é, das necessidades de expansão dos capitalistas franceses. E se este dois países ainda não se julgam prontos para a guerra, a Alemanha o está menos. Em face da situação dificílima deste país, Hitler é forçado a procurar sempre mais sucesso para manter o seu prestígio, e até agora tem conseguido o seu intento graças à covardia dos poderosos de Londres e de Paris. E foi esperando chegar aos mesmos resultados que ele criou o “caso” dos sudetos. Mas durante anos que separam o tratado de Versalhes da vitória dos Nazis e as novas gerações alemãs não passaram pelos quartéis. Para fazer a educação militar de alguns milhões, são necessários numerosos quadros de oficiais e sub-oficiais, e isto requer tempo. Os poderosos da Alemanha têm do estado de preparação de seu exército para guerra uma opinião muito menos favorável que a de seus adversários. Haja visto a atitude do chefe de Estado Maior da Reichsweer, o general Beck.

Pode-se dizer, pois, que todos temem a guerra, e é possível encontrarem uma solução que venha adiar o desenlace e lhes permita protelar por mais algum tempo, mas é possível também que Hitler não possa mais parar, em face da situação que ele mesmo criou, e que ainda neste ano o incêndio abrazou todo o velho continente, para daí se estender ao resto do mundo.

Mas, mesmo que não seja ainda desta vez, não poderá tardar muito. A guerra é determinada sobretudo pela conjectura económica. Os pretextos sempre aparecem. Nós sabemos que o surto industrial anterior a 1913 terminou nesse ano com uma crise, que já não era só de conjectura, mas de estrutura: as fronteiras nacionais se tinham tornado estreitas demais para as forças produtivas da Europa. O resultado foi a guerra de 1914. A nova crise mundial que já se faz sentir desde o começo deste ano alcançará proporções ainda maiores. Todas as contradições em que se debate o mundo capitalista se elevam ao auge do nervosismo e a exasperação que essas condições provocam nos governantes é que determinam as medidas de desespero que eles vem tomando e continuarão tomar.

Por isso a guerra é inevitável dentro de um futuro mais ou menos próximo. E desde já, mesmo antes de se dar o primeiro tiro, a situação é de guerra. Os trabalhadores de toda a Europa já começaram a sentir as conseqüências da guerra. Os milhões de homens de arma, as fronteiras muito bem guarnecidas, os portos militarmente ocupados, a liberdade dos portos começando a ser suspensas nos países “democráticos” ao pretexto de prejudicarem a “defesa nacional” , todas as industrias trabalhando para a guerra em vez de produzir o que é necessário para o consumo, isso tudo já é o peso da guerra que recai sobre os ombros dos trabalhadores dos campos e das cidades.

Como se agruparão os dois caminhos inimigos

Para justificar a sua política militarista e patrioteira, os stalinistas, os social-democratas propalam a idéia de que a guerra terá por missão defender a liberdade e a cultura contra o fascismo. Assim também em 1914 os partidos da Segunda Internacional defendiam, cada um por seu lado, ora a cultura contra a barbárie ora a liberdade contra a tirania. Mas mesmo do ponto de vista puramente formal esta divisão dos campos desperta dúvidas porque eles prevêem a composição de bloco “democrático” em paises como a Iuguslávia e a Romênia, que não estão mais próximos da “democracia” que a Hungria ou a Polónia. Além disso, a diferença de regimes desaparecem com a guerra. Em todos os países, a economia será submetida ao controle do Estado. A censura militar será uma censura política. Qualquer tentativa de oposição será sufocada.

No tocante a luta das “democracias” contra o fascismo, basta-nos olhar para a Espanha. A princípio as “democracias” decretaram o bloqueio contra o governo legal da Espanha afim de não dar pretexto a uma intervenção da Itália e da Alemanha. Mas, quando Mussolini e Hitler dispensaram esse pretexto, as “democracias” , - no interesse da “paz” - apresaram-se em capitular diante da intervenção. A Espanha é devastada. Enquanto isso, as “democracias” se perdem em considerações sobre os meios... de uma não- intervenção ulterior. É que são os recursos minerais da Espanha, e não os seus princípios políticos que determinarão amanhã as suas relações com os outros países. É esta uma lição dolorosa, mas de inestimável valor para o futuro.

A divisão acima citada, se bem que tenha um sentido histórico, não tem o que lhe é atribuído nas vulgares elucubrações pacifistas. A questão é que o fascismo venceu mais facilmente nos países cujas contradições internas haviam adquirido mais acuidade, por não terem matérias primas, por terem sido vencidos na guerra ou porque neles a crise do sistema capitalista se complicam pelas sobrevivências pré-capitalistas. A política exterior desses países tem pois um caráter mais agressivo que a dos países mais privilegiados, que têm por principal preocupação a defesa de suas riquezas arrancadas dos outros.

Daí resulta uma divisão muito condiciona dos países em defensores e adversários do status-quo, pertencendo os países fascistas e semi-fascista de preferência ao segundo grupo. Mas isto não significa de modo algum que serão estes dois grupos que farão a guerra. Em caso de conflito mundial, o programa do status quo, desaparece sem deixar vestígios, trata-se de uma nova partilha do mundo, e a escolha dos aliados não será determinada por simpatias políticas, mas sim pelas situações geográficas, pelos laços económicos e sobretudo pela apreciação das relações de forças. Hitler gostaria muito de tomar colónias à França em aliança com a Inglaterra, ainda que fosse colocar-se contra a Itália, Musssolini por sua vez pode trair Hitler como o governo italiano traiu os Hohenzollen em 1914.

Em suma, não será nenhum critério político ou moral que determinará a disposição dos campos de beligerantes, mas sim os interesses imperialistas.

O Brasil e a guerra

As interdependências de todas as parte de nosso planeta é tal que não se pode esperar a localização de combate militar, qualquer que seja a ocasião e o lugar em que se desencadeie a guerra, ela se estenderá a todos os países do mundo

Os patrões imperialistas a que nosso governo serve não deixarão de arrastá-lo logo a serviço de seus interesses. Se já na guerra de 1914-1918 o Brasil foi levado a declarar guerra à Alemanha, muito mais difícil lhe será ficar neutro agora. Para preparar terreno, Getúlio com planos de “defesa nacional” nos seus discursos. Mas defesa contra quem? Qual o inimigo que ameaça invadir o nosso território? Nem mesmo a necessidade da criação de novos mercados para a produção de nossa indústria, que levaria a essa burguesia a guerra em defesa de seus interesses, nos temos. O Brasil só poderá ir a guerra para defender os interesses dos Estados Unidos ou da Inglaterra e de nenhum outro. Se o povo trabalhador do Brasil não ficar alerta, nossos homens irão morrer, nossas matérias primas se escoarão para os “aliados” em troca de munições velhas e de navios imprestáveis para serem postos a pique, o país se empobrecerá, a carestia da vida e a miséria aumentarão ainda muito mais- tudo isso para que os banqueiros de Wall Street possam satisfazer melhor a sua ganância.

O simples fato da participação do Brasil ao lado dos países “democráticos” revela não somente o caráter da guerra (guerra imperialista apesar da participação da U.R.S.S em um dos bandos) como demonstra a dependência do país ao capitalismo internacional. É por esse motivo, e não por acaso, que a luta contra a guerra imperialista está inteira e estreitamente ligada ao problema da liberdade do Brasil do jugo do imperialismo.

A luta contra a guerra tem, pois de se desenvolver em íntima ligação com a luta contra o imperialismo e seus agentes no Brasil, a burguesia e o seu Estado Novo. É portanto tarefa de todo o povo trabalhador, pois somente nas massas trabalhadoras, aquelas que nada possuem e não vivem da exploração do trabalho alheio, têm independência para lutar contra o imperialismo e suas crises e guerras.

A tarefa estratégica geral do proletariado do Brasil é a de aproveitar-se do enfraquecimento do imperialismo mundial, com seus dois grupos principais engalfinhados em pavorosa luta que ameaça destruir a própria humanidade, para promover a libertação do país por meio de uma revolução que instaurará um governo operário-camponês baseado nos Conselhos de Operários, Camponeses, Soldados e Marinheiros!

Não há outro caminho para chegar à verdadeira paz. Não há outra saída para se ter pão, trabalho, liberdade.

Contra a guerra imperialista! Pela sua transformação em guerra civil libertadora, em guerra revolucionária dos oprimidos contra os opressores estrangeiros e nacionais! Nem homens nem gêneros para os dois bandos imperialista! Comércio apenas com a U.R.S.S, a China, o México e a Espanha republicana.

Viva o Governo Operário e Camponês!

Rio de Janeiro, 17 de setembro de 1938.

Luta de Classe, ano IV?, n.?, 25 de setembro de 1938









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