Terça 16 de Abril de 2024

Nacional

“NÃO ESQUECEMOS A DITADURA, ASSASSINATOS E TORTURAS”

A LER-QI na Luta Contra a Ditadura Ontém e Hoje

29 Apr 2011   |   comentários

No dia 1° de Abril a LER-QI realizou um importante ato para lembrar os 47 anos do golpe militar no Brasil pelo resgate a memória, a verdade e, sobretudo a justiça, exigindo o fim da impunidade aos torturadores. O ato contou com mais de mais de 250 pessoas, entre professores, metroviários, trabalhadores da USP e com importantes delegações de estudantes e jovens operários e estudantes de Franca, Marília, Rio Claro, Campinas, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo e Santo André. Tomaram a palavra para saudar o ato e expor suas opiniões o jornalista e escritor Celso Lungaretti, ex-preso político militante de direitos humanos; Miltão, do Movimento Negro Unificado; e Érico, da Liga Comunista. Dentre os presentes foram saudados o Professor Antônio Rago, da PUC-SP e da Fundação Santo André; a companheira Zezé, do Núcleo de Consciência Negra da USP e os diretores do Sintusp Marcelo Pablito, Diana Assunção e André Pansarini. O professor emérito João Adolfo Hansen, da USP, enviou desde a Califórnia uma saudação ao ato. Marcio Barbio, professor da rede estadual de São Paulo e militante da Ler-qi, mediou a mesa e pediu uma salva de palmas em homenagem às lutas dos operários da construção civil que ocorrem nas obras do PAC que foi reprimida e teve a morte de três operários. Explicou aos presentes que foi feito o convite oficial à direção do PSTU do Rio de Janeiro para estive presente um representante dos 13 presos políticos do ato contra Obama, para que pudéssemos aproveitar essa atividade e dar passos numa campanha nacional pela retirada de todos os processos que pesam sobre esses companheiros. Infelizmente nenhum companheiro pode estar presente visto que apesar de terem sido liberados da prisão, estão impedidos de sair da cidade, ou seja, estão sitiados pelo governo Cabral e a justiça burguesa. A mesa foi composta pela ex-guerrilheira e torturada Criméia de Almeida, pelo professor Emérito da USP Chico de Oliveira, por Claudionor Brandão, demitido político da USP, dirigente do Sintusp e militante da Ler-qi e por Gilson Dantas, militante trotskista, preso político na época e militante da Ler-qi. O Ato mostrou como há a necessidade de romper com a apatia e o silêncio, que inclusive atinge a própria esquerda, e levantar bem alto a bandeira da revogação da lei de anistia e a punição a todos os torturadores militares e seus cúmplices civis. A preparação e realização desse ato e a determinação de seguir firme no combate em defesa dos direitos humanos e pelas questões democráticas é consequência da tradição que desde a LER-QI queremos deixar marcada na esquerda revolucionária do Brasil para que seja expressão do combate ao estado burguês e suas instituições, rompendo o espirito pacifista em “tempos de paz”, principalmente nessa situação de reformismo social que vivemos. Para nós da LER-QI, esta iniciativa deve ser encarada como um primeiro passo para a construção de uma forte campanha nacional, levada a frente pela esquerda, sindicatos, movimentos sociais e grupos de direitos humanos, pela revogação da lei da anistia e a punição a todos os torturadores e genocidas do regime militar. Abaixo publicamos extratos das intervenções dos ativistas, intelectuais e militantes que participaram do Ato.

Chico de Oliveira, sociólogo e professor emérito da USP

“A maior vitória da ditadura é este esquecimento. Este ato é muito importante porque ele está representando e dizendo que os derrotados não esquecerão. Quando os derrotados não esquecem, a coisa começa a girar. A derrota começa a mudar de lado. Este ato tem essa importância, que é sair do esquecimento, sair da sombra. Colocar ao sol os crimes cometidos que há 47. Não foram os primeiros nem serão os últimos. (...) Toda a vez que os derrotados assumem a sua derrota o jogo começa a mudar. E é isso que esse ato representa. Se tivermos a capacidade de re-despertar a sociedade brasileira então muito do arbítrio e sobretudo da desigualdade e da exploração de classe pode ser que no Brasil encontre outro caminho. (...) Só uma mobilização muito forte e atos como este podem nos ajudar a sairmos dessa espécie de letargia política em que fomos submetidos há 47 anos atrás (...) Esse ato mostra que simbolicamente começou a hora de não esquecer. É esse não esquecimento que pode nos levar a desmontar todas as estruturas perversas que a ditadura lançou e que na verdade foram mantidas. Minha saudação aos companheiros da Liga pelo valor de sair da inércia e propor esse debate à sociedade brasileira. É disso que se trata se quisermos um dia poder com autonomia de classe contemplar o horizonte do socialismo”

Criméia de Almeida, ex-guerrilheira, presa política e militante do movimento pelo resgate a memória das vitimas da ditadura

“Eu gostaria de pedir a vocês que continuasse a nossa luta, que é a luta do resgate a memória das vitimas desse país (...). O processo de redemocratização não chega aos pés da democracia anterior ao golpe e não por que ela fosse uma maravilha, nós queríamos mais naquela época. E por que não chega aos pés? Por que o processo de transição lenta e gradual dos militares permitiu que permanecesse nas nossas estruturas do estado o entulho ditatorial.(...) Se agente quer liberdade, se a gente quer direitos nós temos que nos unir. Eu espero estar sempre junto de vocês nessa luta pela abertura dos arquivos da ditadura, pela comissão de verdade e justiça, temos que julgar esses caras e por conquistas e garantias de direitos.”

Gilson Dantas, preso político durante o regime militar, sociólogo e militante da LER-QI

“O que vou falar eu não li em livros de história. Nós que passamos por esse corredor polonês que foi a ditadura brasileira, falamos e sentimos ao mesmo tempo. Por isso vou me basear na história de um operário que viveu a ditadura e morreu nela, ele vai ser uma espécie de lembrete pregado no coração de cada um, porém escrito a sangue. É o operário Olavo Hansen, químico, que morreu em 1970. Ele vai ser pego pela ditadura no 1º de maio de 1970 quando distribuía volantes chamando a organização dos operários pela base e o jornal frente operaria da corrente trotskista que ele fazia parte. Quando ele entra (na delegacia) ele é separado e torturam-no durante seis horas, até destruir seu rim, ele fica em coma, morre e jogam num terreno. Injetaram veneno e forjaram seu suicídio (...) Eu fui preso distribuindo panfletos denunciando a morte de Olavo Hansen na UNB.Em 64 o golpe veio num momento quando a classe operária dava sinais de que podia avançar mais alguns palmos, podia ser sujeito contando com um ambiente revolucionário que era a decomposição séria do exército brasileiro, com os fuzileiros navais se distanciando e chamando o comando dos trabalhadores para os apoiarem, com elementos de guerra camponesa no interior do Brasil. Havia uma situação muito perigosa para a burguesia e a senha para golpe é exatamente na hora que os marinheiros partem para buscar apoio operário pra fazer alguma coisa. O golpe visa como alvo preferencial a classe operaria que não pode se articular com os soldados que estão fraturando o exercito e nem com os elementos de guerra camponesa, por que ai é revolução mesmo, clássica. Então o golpe tem essa face sinistra. Eu diria que quando depois a classe operária se levanta de novo em 68, aí vem é o golpe dentro do golpe, aí a ditadura endurece de vez por que é aí quando a classe operaria novamente levanta a cabeça em Contagem, em Osasco fazendo aliança com os estudantes, arma-se uma aliança operário camponesa. Em 68 começa esse elemento de risco de novo para a burguesia, eles golpeiam dentro do golpe e aí fazem a ditadura de chumbo de vez. (...)A estratégia mais brilhante que apareceu nesse país, era a estratégia proletária, organizando a classe trabalhadora, os aliados pobres, os camponeses, todos os oprimidos, negros, organizando um bloco com a classe operária como caudilho para colocar a ordem abaixo. (...) Na década de 70 a classe operária se levanta novamente... Para derrubar a ditadura com métodos proletários (...) A primeira morte de Olavo Hansen foi física, morreu lutando e sonhando. Eu fui preso distribuindo panfletos contra a morte de Olavo Hansen. Quando a classe operária levanta a cabeça nas greves que Lula vai liderar, eis que Olavo Hansen se põe em movimento. Aí novamente ele morre, desta vez simbolicamente. Porque a classe se levanta, mostra potencial, uma transição pra outra coisa, com a sua cara, que não fosse costurada com a elite militar, buscando derrubar a ditadura com métodos proletários, mas nesse momento eis que costura-se um acordo por cima pra fazer uma transição pactuada onde o torturador vai ser igualado ao torturado, através da lei da anistia.” (...) É importante esse ato amplo, mas ele vai ter mais cor mais brilho na medida que conseguirmos organizar em lugares de trabalho, nas fábricas, em aliança operário estudantil, um movimento que só esse tem o poder de fazer tremer essa máquina policial e o estado terrorista que esta de pé.”

Claudionor Brandão, demitido político e diretor do sindicato dos trabalhadores da Usp e militante da LER-QI

“É um motivo de muito orgulho e alegria de ter nessa mesa companheiros e companheiras como Criméia que sobreviveram à tirania e que podem estar aqui junto com a gente como parte viva dessa história, uma história que não podemos esquecer e que o preço do esquecimento pode ser muito alto para todos nós (...) Em que pese os esforços valorosos da luta dos companheiros que militaram pelos direitos humanos, a lei de anistia colocou um sinal de igual entre o assassinado e seu assassino, colocou um sinal de igual entre torturado e torturador entre o sequestrado e o sequestrador quando se propõem anistiar a todos. Isso serviu, em última instância, para que os ditadores e militares anistiassem a si próprios.(...) É com base nessa impunidade e legitimidade que se perpetua até hoje, graças ao esquecimento e omissão das organizações de esquerda, que a ditadura pode continuar sem fardas, uma ditadura a paisana. E onde tem se expressado essa ditadura? Na continuidade da repressão a todas as mobilizações operárias e populares, a todas as greves e lutas que enfrentam repressão violenta em nome da suposta ordem, na continuidade dos assassinatos, quer seja em casos individuais como o de Chico Mendes, quer seja nos massacres coletivos como da fazenda Santa Eliana em Rondônia ou como no caso de Eldorado dos Carajás, é importante lembrar a invasão da usina siderúrgica de Volta Redonda e o assassinato de três operários; é produto da impunidade. Ocupação das refinarias por tanques do exército no governo de FHC para reprimir a greve dos petroleiros, o massacre do Carandiru com 111 mortos, no massacre das crianças da Candelária.(...) Então companheiros, a militarização dos morros do Rio de Janeiro, a ousadia de prender como terroristas 13 manifestantes que faziam uma manifestação contra a presença do imperialismo norteamericano é produto da impunidade. Ocupação da policia na Usp, nos campi da Unesp e recentemente na Unicamp é produto da impunidade. Mas onde a continuidade dos crimes, das torturas e dos assassinatos prosseguem todos os dias são nas periferias das grandes cidades, no massacre cotidiano dos jovens pobres e negros. E por que continuam assassinando e torturando? Por que seguem impunes.(...) Qual foi a missão histórica dessas ditaduras? Foi a de impedir que a juventude e a classe operária pudesse colocar em xeque o poder da burguesia, o seu estado e a propriedade. Se tratava ali de neutralizar o risco de revolução, se tratava ali de impedir que a classe trabalhadora brasileira pudesse dar um salto a sua emancipação(...) Não é possível levar a luta contra os ataques em face da crise econômica, falar da luta pela democracia, pelo direito de greve se não for numa luta para trazer à tona os criminosas da ditadura, expô-los a público, levá-los a julgamento e puni-los.”

Saudação de Elia Espen, membro da linha fundadora das Mães da Praça de Maio da Argentina

“Eu, como mãe de um desaparecido, quero enviar uma saudação, quero chegar a todos os lutadores e desaparecidos que quiseram mudar tantas injustiças e que os genocidas não deixaram realizar seus sonhos.(...) Vocês são o presente, uma grande geração futura que depende de todas nós. Basta de ditaduras, por única democracia verdadeira e não mentirosa, sem crianças que morrem de fome, que não acabem com os direitos dos aposentados e trabalhadores. Jovens, até a vitória sempre, com todos os desaparecidos, presente. Um grande abraço.”

Saudação de Victoria Moyano, filha de desaparecidos políticos, vítima do Plano Condor e membro do centro de profissionais pelos direitos humanos da Argentina (CEPRODH)

“Queria mandar uma saudação aos companheiros da LER-QI que vão levar esse dia de luta, um dia para lembrar a data do golpe militar. Todos nós sabemos que as ditaduras na América latina foram ditadas desde Washington e com as distintas empresas dos países latino americano. (...) O Plano Condor foi uma resposta aos processos revolucionários do cone sul, queriam aniquilar as vanguardas operarias e populares que estavam lutando contra o capitalismo.(...) Nós marchamos no dia 24 de março, data do golpe na Argentina, com mais de 30 000 mil companheiros lutando por juízo e castigo aos genocidas e que se abram os arquivos da ditadura. Também lutamos pela repressão de ontem, mas também pela de hoje.(...)É necessário seguir lutando contra os genocidas de ontem e hoje, mas devemos ter claro que a única maneira de conseguir isso é derrotando e expropriando a classe dominante, que são os grandes empresários, que não vacilaram em planejar o genocídio na argentina e na América Latina”

Rafael Borges, estudante de direito, juventude da LER-QI

“Pra acabar com a impunidade e punir torturador, abertura dos arquivos do regime repressor, U NI DA DE! Unidade operário estudantil, resgatando a memória nesse 1º de abril”

“Nós da juventude da LER-QI, trabalhadores e estudantes, nos colocamos a tarefa de superar o espírito de época da nossa geração, alimentado pelo individualismo, conservadorismo e consumismo, nos colocando na primeira fila de todas as lutas democráticas, como no combate contra o racismo, o machismo e homofobia, além de, como levanta esse importante ato de hoje, levantarmos bem alto a bandeira da memória, da verdade e da justiça aos companheiros que tombaram, lutando pela abertura incondicional de todos os arquivos da ditadura e punição de todos os torturadores e assassinos militares e civis da ditadura.”

Heloisa Greco (Bizoca) do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania – Belo Horizonte, Minas Gerais

“(...)Ainda não conquistamos o direito à verdade, ao passado, à história e à memória enquanto dimensão básica de cidadania, o que passa necessariamente pela construção de uma Comissão de Verdade e Justiça independente e popular. Estas evidências constituem exemplo expressivo da sobrevivência da ditadura militar no pessimamente chamado Estado democrático de Direito. (...) Concluo saudando a iniciativa das companheiras e companheiros da LER-QI e reiterando que para nós, do Instituto Helena Greco de Direitos Humanos e Cidadania, o combate a esta situação de barbárie é necessária e ontologicamente uma luta contra hegemônica. Entendemos que a luta pelos direitos humanos só pode ser travada na perspectiva classista da construção de mecanismos de contrapoder, contradiscurso e contramemória.”

Saudação enviada por Beatriz Abramides, presidente da associação de professores da PUC

“A APROPUC-Associação dos Professores da PUC-SP vem saudar a iniciativa da LER-QI na realização deste importante debate, bem como a tod@s que estão presentes, debatedores e participantes deste ATO CONTRA O GOLPE MILITAR de 1964 e que repudia os 47 anos de impunidade contra os crimes da ditadura neste país. Nós militantes, trabalhadores, estudantes devemos continuar combatendo a ditadura o que significa lutar pelo fim do pacto da anistia de 1979, pelo fim dos pactos institucionais que "em nome da verdade" só a escondem. Lutar pelo fim da impunidade pressupõe a exigência de que todos os documentos do período da ditadura militar sejam abertos e os torturadores sejam denunciados e punidos.”

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