Quinta 25 de Abril de 2024

Nacional

Discussão sobre o Novo Partido umaoportunidade perdida

A ESD lança seu novo partido por fora da participação dos trabalhadores

12 May 2004   |   comentários

O debate sobre a construção de um novo partido frente ao desmascaramento do verdadeiro caráter do PT, que se travou ao longo do ano passado entre setores da esquerda que rompem com este partido, o PSTU e ativistas do movimento sindical ligados ao funcionalismo público, encerra hoje toda uma fase. O saldo do processo é a consolidação da divisão em dois blocos e o lançamento do novo partido da Esquerda Socialista e Democrática, bloco liderado pelos parlamentares “radicais” expulsos do PT e por intelectuais oriundos da mesma sigla. Este lançamento, marcado para o começo de junho, confirma a tendência que já estava esboçada desde o início do ano, ou seja, que a disputa entre os aparatos se mostrou realmente o elemento determinante em todo o processo. Cada um a sua maneira, tanto as lideranças da ESD como a direção do PSTU, construíram esse final lamentável para o processo, ao se negarem a lutar para que a classe trabalhadora, através de seus próprios organismos e suas próprias lutas, fosse o principal sujeito da construção do novo partido. Restringindo o debate real apenas à cúpula das correntes, as direções travaram um processo que poderia ter envolvido dezenas de milhares de trabalhadores em todo o país.

O eleitoralismo é a outra face da exclusão dos trabalhadores

A lógica parlamentar mais rasteira, demonstrada hoje pelos principais dirigentes da ESD, é a contrapartida necessária da falta de uma luta pela independência política dos trabalhadores. Ao se recusarem a basear o novo partido no espírito de luta da classe trabalhadora e da juventude, só resta à ESD focalizar-se nos “espaços” dados pelo próprio regime capitalista, em especial nas eleições.

Assim é que chegamos ao momento atual, em que a ESD está prestes a lançar o seu novo partido, e já iniciou a campanha de Heloísa Helena para presidente em 2006, antes mesmo que o partido seja construído. Porém não se trata de um “surto eleitoralista” repentino. Desde que se con-formou, a ESD tomou um rumo que já apontava essa tendência.

A pressa hoje em anunciar a candidatura de Heloísa Helena está, no mais, de acordo com a reivindicação que fazem de toda a trajetória do PT até a eleição de Lula. Durante toda essa trajetória, como agora, os trabalhadores se limitavam à luta económica, reivindicativa, e a política ficava a cargo dos políticos profissionais com sua estratégia conciliacionista.

Essa é a história que se pretende repetir: os servidores públicos que lutaram durante 2003 numa dura greve contra o governo, por exemplo, não tiveram nenhum poder de decisão no processo, apesar de serem o setor em que a ESD tem se apoiado desde a mobilização contra a reforma da previdência. Nenhuma assembléia de base, nenhum comitê de servidores foi formado para discutir os destinos do novo partido. A mesma coisa esse ano: mais uma vez os servidores públicos estão numa greve difícil contra o governo, mais uma vez os dirigentes da ESD participam do processo, e mais uma vez se negam a colocar o seu novo partido a serviço da luta. Impedem assim que essa greve possa se transformar numa verdadeira demonstração de força dos trabalhadores, que de outro modo poderiam desestabilizar o regime pela esquerda utilizando seus pró-prios métodos de luta, e combinando a luta reivindicativa com a luta política.

O que vemos, tanto agora como no ano passado, é que a mesma ESD que não deixa de mobilizar os trabalhadores da base dos seus sindicatos para a luta reivindicativa, ainda que apenas dentro dos limites de sua estratégia de pressionar para negociar migalhas, exclui completamente esses mesmos trabalhadores de qualquer discussão referente aos rumos que terá o novo partido. É mais uma vez a expressão da separação absoluta entre a luta política e a luta económica.

Da mesma maneira, em São José dos Campos, por exemplo, a ESD, que já dirige há anos os trabalhadores químicos da região, comemora hoje a vitória sobre o PSTU nas eleições sindicais na importante categoria dos condutores. Nessa batalha pela direção sindical, porém, nenhuma das partes pautou a necessidade de uma nova ferramenta política para os trabalhadores imporem seu programa de saída para a crise, apesar de que a crise económica e a desilusão com o governo terem sido amplamente utilizados como argumentos para ganhar votos nas eleições sindicais. Tampouco isso é casual. Se os trabalhadores determinassem os rumos do processo, isto é, se a eles fosse permitido expressar-se na vida política, isso dificultaria enormemente a política oportunista e conciliadora das direções.

A conclusão é uma só: o novo partido da ESD vai sair, no entanto seu programa não foi discutido em nenhuma fábrica, em nenhuma grande empresa de serviços ou repartição pública, em nenhum local de trabalho, estudo ou moradia. Se as direções desse bloco dizem que o grande problema do PT é que ele se burocratizou ao longo dos anos, o que se pode esperar do seu novo partido, que já nasce de maneira totalmente burocrática.

Também com relação à construção partidária não se pode separar os meios dos fins, isto é, os métodos empregados para construir o partido dizem muito sobre os objetivos desse mesmo partido. Isso vale tanto para a ESD, como para o PSTU. A questão vital aqui, mais uma vez, reside no abandono por essas cor-rentes da luta pela independência política dos trabalhadores.

Um novo partido à sombra do PT

O que chama a atenção nos debates em que as direções da ESD se manifestam é que, em meio ao mar de concepções políticas heterogêneas e conflitantes, um ponto é consenso geral: todos concordam que o novo partido não deve ser revolucionário. Mais ainda, nos debates internos chega a ser uma heresia propor semelhante coisa. Porém resta uma pergunta: se o partido que esses setores vão lançar não é revolucionário, o que ele é? Certamente não é um partido de massas dos trabalhadores, sustentado política e materialmente pelos sindicatos e entidades de massas, que expressasse a independência política dos trabalhadores. Inclusive nenhum setor da ESD propós em nenhum momento um partido com essas características. Só há uma conclusão: o novo partido da ESD não é nem um partido revolucionário de vanguarda, nem um embrião sequer de um partido de massas politicamente independente.

Por isso para a estratégia dos dirigentes da ESD, não se trata de dar uma luta à morte para acelerar a ruptura da classe operária e do conjunto das massas com o PT e dar uma perspectiva de independência política a essa ruptura. Pelo contrário, para a ESD trata-se de buscar ligar-se aos dirigentes e políticos profissionais da esquerda petista. Em português claro: A ESD tem um acordo com esses dirigentes, por isso não há nem pode haver uma política ofensiva do “novo partido” em direção aos milhões de trabalhadores que seguem o PT. Até pelo menos o mês de novembro desse ano, existe um acordo eleitoral, a partir do qual setores que hoje compõem a esquerda do PT ficarão no partido para disputar as eleições de outubro.

A ESD, que no momento não possui legalidade, espera até lá para chamar o voto nos “companheiros” do PT, para tentar compor com os setores petistas que discutem uma ruptura após o resultado eleitoral, de preferência já com algum mandato garantido.

Por outro lado, a aparição da fração pública “Liberdade Vermelha” da DS, encabeçada por Heloísa Helena e João Machado, é uma tentativa de responder à crise que existe na DS pela escandalosa participação de Miguel Rossetto como ministro no governo capitalista de Lula, sem no entanto questionar seriamente as razões de fundo que levaram essa corrente a uma degeneração tão profunda.

Por isso dizemos que a ruptura dessa fração com o PT é meramente organizativa, sem inclusive terminar de romper com a política de alimentar ilusões no governo, como fazem em sua plataforma: “Ainda que os setores críticos à ALCA no interior do governo venham (...) a impedir sua implementação, e os setores favoráveis à reforma agrária consigam efetivar o PNRA [Plano Nacional de Reforma Agrária] previsto(...), a orientação geral da política económica não será alterada.” . Como se ainda fosse possível pór em dúvida o compromisso de Lula com o imperialismo e a Alca, e sua negativa com respeito à reforma agrária!

A DS fica assim com um pé no PT e o outro na ESD, sem alterar sua política de compromisso entre uma fraseologia socialista e uma política voltada à conciliação de classes.

Porém esse não é um problema que se restrinja à DS. O mais grave em tudo isso é que a ESD, que lança um novo partido que se pretende anticapitalista, tem sua principal figura pública numa corrente ligada por mil laços ao governo capitalista de Lula. E sobre essa questão vital os companheiros da ESD não se pronunciam publicamente.

Por uma ferramenta política com uma estratégia e um programa claramente revolucionários

Nossa luta é para que a crise do petismo possa se transformar em uma nova base para que os trabalhadores possam compreender a necessidade de lutar por sua independência política de classe, e avancem para construir uma nova ferramenta política, com uma estratégia e um programa revolucionários.

Existem elementos de recuperação na luta operária e popular que vêm se expressando desde a eleição de Lula, e mostram uma base real sobre a qual erguer novas tradições e direções que possam estar à altura das tarefas que estão colocadas. O arrocho e o desemprego provocados pela patronal e pelo governo, somados à política de “reformas” pró-imperialistas de Lula colocam no horizonte um recrudescer das lutas de classes.

Em cada estrutura onde a luta económica ou política começar a se desenvolver se colocará a necessidade de um novo partido que unifique e centralize essas lutas em direção a uma ruptura com a democracia dos ricos e rumo a uma saída revolucionária.

A política que as direções da ESD estão impondo ao ativismo gerado pela discussão de novo partido só vai levar ao conciliacionismo e frentepopulismo.

Não é possível se limitar a ocupar o espaço deixado pelo PT, com a mesma lógica política do PT: por mais difícil que seja o processo de experiência e superação desse partido, esse processo não poderá parar a meio caminho.

Por seu lado, a direção do PSTU também demonstrou não ter uma estratégia superior, e por isso fica agora com seu “Movimento por um Novo Partido Socialista” pendurado no ar.

É necessário que os revolucionários busquem uma política distinta, colocando todos os seus esforços na luta para ligar-se aos principais bastiões da classe operária, e aos setores mais avançados dos trabalhadores, do povo pobre e da juventude que surgirem no decorrer das lutas de enfrentamento com o governo.

Só assim poderemos forjar uma nova vanguarda revolucionária, que numa perspectiva internacionalista ajude a classe operária brasileira a elevar-se à altura de suas tarefas históricas.

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