Quinta 28 de Março de 2024

Movimento Operário

RUMO AO I CONGRESSO DA CONLUTAS

A Conlutas precisa lutar pela independência política dos trabalhadores diante do chavismo

17 Jun 2008 | Na última edição do jornal Palavra Operária publicamos uma entrevista com Claudionor Brandão, militante da LER-QI e diretor, como minoria, do Sindicato de Trabalhadores da USP (Sintusp). Nessa entrevista, Brandão expressa porque o I Congresso da Conlutas deve deflagrar um combate contra a influência de Chávez sobre os trabalhadores latino-americanos. A seguir damos continuidade a este debate ligando-o às lutas políticas que têm se dado dentro da Conlutas sobre esta questão.   |   comentários

Palavra Operária: Os chavistas dizem que Chávez se enfrenta contra o imperialismo norte-americano...

Brandão: Nós trabalhadores precisamos
saber diferenciar os discursos enganosos
das ações concretas, que são as que dizem
como de fato são as coisas. Chávez de fato faz muitos discursos empolgados contra Bush. Mas, na prática, continua pagando a dívida externa aos banqueiros internacionais,
garante os exorbitantes lucros das empresas multinacionais na exploração do petróleo venezuelano, e, por estranho que pareça, garante o fornecimento de petróleo para os EUA, o que é indispensável para que Bush possa continuar suas guerras que massacram
os povos do Oriente Médio. Amigo de Lula, Cháves obviamente nunca questionou
a participação do exército brasileiro nas forças “de paz” que fazem o serviço sujo para o imperialismo no Haiti. Mas foi na recente
crise entre a Colómbia e o Equador que Chávez mostrou seu verdadeiro “antiimperialismo” .
Depois que o presidente da Colómbia
(Uribe), mancomunado com Bush, invadiu o território equatoriano para atacar as Farc, o que fez Chávez? No auge da crise, chegou a fazer todo um cenário enviando as tropas venezuelanas para a fronteira com a Colómbia. Entretanto, depois terminou abraçando Uribe no encontro internacional que colocou “panos quentes” sobre a crise. Nem Chávez, nem Evo Morales (presidente
da Bolívia), nem Correa (presidente do Equador), estes que muitos setores da esquerda
hoje reivindicam como governos “progressistas” , foram capazes de defender uma condenação minimamente séria ao ataque
de Uribe contra o Equador. Não foram capazes nem mesmo de romper relações diplomáticas com a Colómbia e exigir a expulsão
das bases militares norte-americanas instaladas no Equador. Essa linha evoluiu até o ponto de que hoje Chávez soma-se à campanha
reacionária do presidente colombiano e de Bush ao pedir a rendição incondicional das Farc, e tem agendado um encontro direto
com Uribe.

Palavra Operária: Os chavistas dizem que uma das provas do “antiimperialismo” e do “socialismo” de Chávez é que este nacionalizou empresas como a Sidor...

Brandão: Justamente o contrário. A medida de pseudonacionalização da Sidor é conseqüência direta da luta dos trabalhadores
siderúrgicos nos últimos meses por melhores condições de trabalho e salário, no bojo da qual uma de suas principais demandas
era a reestatização dessa empresa que foi privatizada em 1997. Foi depois de o governo atuar claramente ao lado da patronal transnacional, e após ter enviado a Guarda Nacional para reprimir os operários
da Sidor, que Chávez diante da firmeza dos trabalhadores se viu obrigado a adotar a pseudonacionalização. Ou seja, foi um triunfo dos trabalhadores e uma medida que eles arrancaram do governo. Para enganar os trabalhadores, Chávez diz que os patrões da Sidor são “a transnacional capitalista exploradora”
e fala em “escravismo” . Entretanto, citemos literalmente as palavras utilizadas por Chávez logo após o anúncio da pseudonacionalização
para tranqüilizar os empresários:
“Com Rocca [dono da Sidor] somos sócios.
Queremos que o grupo Paolo [patrões da Sidor] siga operando na Venezuela. Queremos
uma sociedade igualitária.” E assim responderam os patrões: “Desejamos que a Sidor, cuja transição em mãos do Estado já começou, continue o caminho do êxito (...) Nosso compromisso segue firme para contribuir
com nosso aporte.” Essa “sociedade igualitária” entre os dois “sócios” , logo após a tão barulhenta “nacionalização” , é na verdade
um acordo mediante o qual o governo propõe aos patrões da Sidor que aceitem ficar
com 20% das ações, parte da empresa, a comercialização da produção no exterior etc. É isso que explica que os patrões não têm gritado contra o anúncio de Chávez. O próprio decreto de “nacionalização” estabelece
que Chávez pagará aos donos da Sidor os melhores preços de mercado pela empresa. Assim, este acordo permitiu que Chávez aparecesse como “nacionalista” e ao mesmo tempo garantiu aos empresários um bom negócio. Um bom exemplo do caráter
dessa pseudonacionalização de Chávez é sua política em relação aos trabalhadores
terceirizados da Sidor. Aqui no Sintusp uma das principais lutas que travamos contra
a reitoria e que foi aprovada em nosso IV Congresso é pelo fim da terceirização, com a incorporação dos terceirizados como trabalhadores efetivos da USP. Pois bem, a “nova” Sidor de Chávez mostra rapidamente seu verdadeiro rosto negando-se a incorporar
como trabalhadores efetivos os mais de 9.000 terceirizados, ingressando menos de 1.000 trabalhadores (quando o patrão antes já havia proposto incorporar 600 deles). No convênio coletivo firmado com o sindicato, se mantém as empresas terceirizadas, o que não elimina o problema da terceirização, e se ratifica permitindo que siga a “escravidão” da qual fala o “comandante” . Por isso, os terceirizados da Sidor têm saído à luta por sua incorporação como efetivos da empresa. Vêm se mobilizando contra a empresa e o sindicato, já que a burocracia (ligada ao governo)
os deixou de fora apesar de que eles tinham se somado a todos as paralisações anteriores, levantando a consigna “igual trabalho,
igual salário” . Frente às mobilizações dos trabalhadores terceirizados para serem incorporados como efetivos, canalhescamente
Chávez disse que isso não é possível porque a empresa “quebraria” , e chamou de “contra-revolucionários” os que reivindicam
esse direito. Isso não é de se estranhar, pois os funcionários do governo Chávez que antes da “nacionalização” faziam parte da direção da empresa sempre apoiaram sem objeções suas políticas trabalhistas, e jamais denunciaram violações nem maltratos aos direitos trabalhistas e muito menos os danos
ambientais. É verdade que o anúncio da “nacionalização” da Sidor por parte de Chávez,
como fruto da forte luta levada a cabo pelos trabalhadores siderúrgicos, gerou alegria
entre os trabalhadores. Mas é necessário
distinguir entre esta alegria operária e o “triunfalismo” de alguns partidos, grupos e dirigentes chavistas que pretendem tomá-lo como ponto de apoio para seguir enganando os trabalhadores com o projeto de “socialismo
com empresários” do chavismo.

Palavra Operária: Como caracterizar a política que a direção da Conlutas tem tido em relação a Chávez?

Brandão: O PSOL (principalmente sua corrente interna chamada MTL), que apóia o governo Chávez, já vinha ameaçando
romper com a Conlutas caso esta se posicionasse
contra o chavismo. O PSTU, que é a direção majoritária da Conlutas, apesar de defender em sua propaganda o combate ao chavismo, vinha cedendo frente a essa ameaça,
impedindo que a Conlutas cumpra o papel
que tem de cumprir. A ameaça do MTL também se colocava contra a realização de um encontro latino-americano (Enlac) após o Congresso da Conlutas, onde estaria presente
uma corrente de trabalhadores da Venezuela
que se opõe a Chávez, a C-Cura. A adaptação do PSTU ao MTL chegou ao cúmulo
de que, na reunião preparatória para o I Congresso, que ocorreu nos dias 8 e 9 de junho em São Paulo, o PSTU fechou um acordo com o PSOL para defenderem juntos
que o I Congresso não tirasse nenhuma resolução de combate ao chavismo. Esse era um acordo que aparentemente permitiria a realização do Enlac sob essas condições. Como subproduto desse acordo, recentemente
foi publicado no site da Conlutas uma “Proposta de manifesto” sobre os governos
latino-americanos que nem mesmo menciona a palavra Chávez. Essa atitude é uma vergonha e deve ser repudiada. Mesmo
com todas as lamentáveis “concessões” do PSTU, o MTL recentemente publicou uma declaração rompendo com a Conlutas, mostrando que para eles sua unidade com Chávez é mais importante que a Conlutas, e que o PSOL nem mesmo se propõe a defender
suas posições perante os delegados do Congresso.

Palavra Operária: Como a Conlutas deve se posicionar diante do chavismo?

Brandão: A Conlutas deve impulsionar
uma campanha que combata as ilusões que Chávez desperta na classe trabalhadora de que é possível um “socialismo com empresários” .
Devemos denunciar o caráter burguês e antioperário do governo Chávez, e fazer exigências que desmascarem suas mentiras, como por exemplo exigindo uma verdadeira nacionalizaçção sem indenização ao patrões e sob controle dos trabalhadores. Devemos colocar claramente que só um governo operário, camponês e popular na Venezuela, baseado em organismos de democracia
direta das massas, pode resolver as demandas do povo venezuelano; e que para tal é necessário construir um partido operário revolucionário naquele país em luta contra o Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV) que Chávez busca construir
junto com empresários, exigindo que os sindicatos se atrelem a este partido, num ataque frontal à autonomia e à independência
sindical.

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